segunda-feira, maio 02, 2005

“O INIMIGO PÚBLICO”


O «oInimigoPúblico» / IP (suplemento, à Sexta-feira, do PÚBLICO) é dos tais de que, com toda a propriedade, se poderia dizer: se não existisse, tinha de ser inventado.

Quanta imaginação perpassa por todo o jornal!… Quanto verrinoso humor! Quanta perspicácia na observação da actualidade!...

Pelo sim, pelo não, deixa o aviso, na tal letra miudinha, pouco incentivadora da leitura: “O Inimigo Público é um jornal satírico, sendo todo o seu conteúdo ficcional”.

O que, noutros tempos (no 24 de Abril), de nada lhe serviria: o coronel-censor nem o mais ínfimo pó do seu lápis azul gastaria com tal “encomenda”… Rasgava-o todo, simplesmente: “que despudor, que falta de respeito por públicas, prestigiadas e conceituadas figuras… E a moral… (não sei quê), e os brandos costumes… (não sei que mais), e os valores… (não sei quantos)… Condenado. Para o lixo. Para a fogueira. Acabou-se” - sentenciaria o guardião dos bons costumes e da salazarenta tranquilidade.

Felizmente que são outros os tempos. Ainda bem que o inteligente e arguto humor é cultivado.

O seu ponto de partida está, claramente, definido: “Se não aconteceu… podia ter acontecido!”.

E vai por aí fora: corroendo, aqui; mordiscando, acolá. Não perdendo nada, não poupando ninguém. Sempre hilariante e impagável.

O IP bem podia, e com propriedade, adoptar a multissecular divisa:

ridendo castigat mores”, que, como se sabe, e numa tradução livre, e numa linguagem mais expressiva, quer dizer que, até a rir, se pode dar porrada nesta “tropa”.

Mas ao mais sensível visitante, sempre o IP, estou disso certo, reconhecerá os direitos inalienáveis do leitor (dil), designada e particularmente, os 5º, 2º, 3º e, sobretudo, o 1º. Que, respectivamente, são, aproveito para lembrar: “5º) o direito de ler uma coisa qualquer; 2º) o direito de saltar páginas (ou artigos); 3º) o direito de não acabar um livro (jornal, suplemento ou artigo); 1º) o direito de não ler.
Como é evidente e, hoje, indiscutível.

Já agora, é com o mesmo fundamento (dil), que faço algumas transcrições do IP, invocando os 8º e 6º direitos, a saber:
8º) o direito de espiolhar por aqui e por ali; e, 6º) o direito ao bovarysmo.

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Da última edição (SX 29 ABR 05) destaco:

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BOLSA DAS ALMAS

Vítor Elias/António Marques

A subir

SECA NO ALENTEJO

Todos os dias se ouvem portugueses queixarem-se da seca extrema que afecta o Sul do país. Todos mostram falta de visão. Ao contrário de João Lagos, que se prepara para trazer para Portugal a abertura do mítico Paris-Dakar, doravante denominado Lisboa-Dakar. Porquê?

Porque a caravana vai atravessar as paisagens áridas do Alentejo, cada vez mais parecidas com o deserto africano, a verdadeira essência da prova. Mas o Alentejo pode e deve ir mais longe, servindo de cenário a filmes como os recentes “Sahara” ou “A Guerra das Estrelas”, normalmente rodados em Marrocos. Para além do mais, os alentejanos poderiam abandonar as suas ovelhas, dedicando-se à criação de camelos, desviando assim os milhões de turistas que todos os anos visitam países como Marrocos, a Tunísia ou o Egipto.

Como sempre, enquanto uns olham para as cortinas, outros olham para o horizonte.

(…)

A descer

FERIADO DO 1º DE MAIO

A frente Comum dos Sindicatos acusou algumas autarquias, entre as quais a de Lisboa, de estar a fazer pressão para que o 1º de Maio, Dia do Trabalhador, não seja considerado feriado. Não há nenhuma razão para comemorarmos ainda o Dia do Trabalhador. Portugal tem 600 mil desempregados, número que ameaça subir a médio prazo.

A juntar a estes há ainda as largas centenas de lisboetas que nunca trabalharam na vida, vivendo graças ao Rendimento Mínimo Garantido e/ou aos pais ou mulheres. Some-se agora os milhares e milhares de delinquentes que assaltam, violam e matam por esse país fora. Para não falar dos bêbedos e dos drogados. Já agora, vamos dar uma volta aos quartéis, onde os militares passam a vida a embebedar-se nas messes. Terminaremos a ronda pelos 800 mil funcionários públicos improdutivos, mal-educados e incompetentes.

Mais que comemorar o Dia do Trabalhador, conceito anacrónico, seria bem mais coerente instituir o Dia do Desempregado ou o Dia do Incompetente. Nesse caso, Portugal em peso poderia comemorar o feriado com verdadeira legitimidade.

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Como destaco, ainda, outra interessante peça.

A imagem é a de uma caixa de correio antiga, com uma gravação, em relevo, de uma pomba transportando, no bico, uma carta. E a que se afixou um colante de que consta:

PROPAGANDA DA PIDE

A Q U I N Ã O

E, então, era assim:

Lista era contra

Publicidade da PIDE

Maçonaria confundiu defesa do consumidor com opressão fascista

MÁRIO BOTEQUILHA

Na lista vinda a público no banquete da Maçonaria constavam apenas os nomes de 3 600 consumidores que manifestaram o desejo de não receber mailing da PIDE e, a partir de 1969, da DGS. Na década de 50, as caixas de correio começaram a ser entupidas com apelos da polícia política para a denúncia das chamadas “actividades contra o estado: o comunismo, a fome, a literacia, a masturbação e principalmente a masturbação de intelectuais comunistas esfomeados.

Foi o próprio Secretariado Nacional de Propaganda de António Ferro quem elaborou uma lista de residências que deixaram de receber folhetos sobre atrocidades contra anticolonialistas no Tarrafal, fins-de-semana de privação do sono no Governo Civil, torturas com beatas acesas e asfixia com toalhas molhadas na sede da Rua António Maria Cardoso ou os programas de cinco dias com meia-pensão, interrogatório, tribunal plenário, carga de porrada e pena incluída.

Já a propaganda à Legião e à Mocidade Portuguesa era muito bem vista. Os pais acreditavam que uma boa lavagem ao cérebro com o ideário nacionalista libertava as crianças de chagas sociais como a droga, o álcool, a prostituição e a maçonaria.

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Mas o IP tem mais, muito mais. E está em cima do acontecimento, como mostra esta outra peça do mesmo Mário Botequilha:

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A ANÁLISE QUE LUÍS DELGADO GOSTAVA DE TER ESCRITO

Telmo Correia perdeu porque foi dormir

Telmo Correia foi líder do CDS-PP durante um período meteórico: entre a manhã de quinta-feira e a tarde de sábado. Porque perdeu?

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O discurso

Esteve bem ao comparar Portas a Karol Wojtyla, Amaro da Costa a Winston Churchill e Freitas ao Pato Donald. No entanto, quando subiu ao palco, Telmo sabia que tinha perdido. Fez um discurso tíbio e eutanásico que adormeceu metade dos presentes e agravou o estado vegetativo dos restantes. O Congresso ficou com a vaga ideia de que a moção que alguém escreveu por ele defendia a esterilização dos pandas e um posicionamento ideológico entre o Bloco de Esquerda e Hugo Chavez.

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As promessas

A desilusão instalou-se rapidamente na Juventude Popular quando Telmo exigiu uma revisão dos estatutos para que o partido aceitasse militantes com menos de 12 apelidos e na Liga das Mães Democratas-Cristãs com Oito Filhos em cada Perna ao não se comprometer a bombardear Badajoz.

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O sono

Depois da directa, os congressistas não lhe perdoaram ter ido dormir a casa quando todos eles tinham passado a tarde de sábado a dormir na FIL durante o seu discurso.

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O elogio

Paulo Portas chorou agarrado a Celeste Cardona ao ouvir o panegírico de Telmo que lhe chamou “pai da democracia, tio da liberdade e cunhado dos valores familiares” e o exortou a ter 15 filhos para que a Humanidade não perdesse tão valioso património genético. O ex-líder agradeceu apoiando Ribeiro e Castro através do seu nobreguedesfone.

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Acerca deste último trabalho, só tenho um reparo a fazer, a MB, e mais um argumento a recordar-lhe.

Começo pelo argumento esquecido: não foi só “para que a Humanidade não perdesse tão valioso património genético” que Telmo “exortou (Portas) a ter 15 filhos”. Não apenas. Mas também para que tivesse 15 vezes mais motivos que Louçã para apreciar o que é a vida, não através do sorriso de uma, mas de 15 crianças.

Depois… o reparo.

Compreendo, admito que se “brinque” com coisas mais ou menos sérias (ou menos mais; talvez antes: menos menos). Mas, meus amigos, para tudo há um limite: “entrar” com Luís Delgado… Isso não. Nunca.

Só porque o não merece. É o mais isento “cronista oficial” de qualquer cônsul, de qualquer tempo. De todas as épocas. (Pena que a sua pena apenas tivesse “servido” o recente e fugaz governo… de inesquecível memória, contudo).

Deixem o pobre do homem em paz. Deixem-no em sossego.

Ser cronista oficial e “comissário político” - de tão canina fidelidade - de tamanho e tão inolvidável líder… Não é tarefa fácil! Arrasa qualquer um. Desgasta. Cansa. (Embora o enalteça).

Por favor: deixem a criatura em paz, repito. Não perturbem o rapaz, insisto.

Entendido?

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