segunda-feira, maio 30, 2005

O ANEDOTÁRIO NACIONAL E O HUMOR REFINADO


Em matéria de anedotário, a produção nacional estava bem servida com os trutas do costume: com A J Jardim à cabeça, Santana Lopes e Paulo Portas, como acólitos, Valentim Loureiro e Pinto da Costa a pegar no pálio e Luís Delgado como cronista-mor deste reino da macacada.

Claro que este tipo de humor (por vezes negro) nunca se esgota: cada reino e cada corte tem sempre os seus truões residentes.

Mas não é desse humor que falo: antes doutro muito mais saudável. E deste, do verdadeiro, do autêntico humor, a produção nacional estava a ficar um bocado estagnada.

É, pois, desse outro humor que falo. Duma outra inteligência. Duma outra textura. Duma diferente argúcia: falo, claro, d’o Inimigo Público, o tal que fala do que se não aconteceu, podia ter acontecido. O tal que, pelo sim, pelo não, sempre vai avisando que é um jornal satírico, sendo todo o seu conteúdo ficcional.

No passado fim-de-semana, O Inimigo Público brindou-nos com mais uns tantos deliciosos trabalhos dos seus redactores.

Por exemplo, as seguintes duas entrevistas de Mário Botequilha com as mais destacadas figuras portuguesas na cena internacional:

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Presidente da Comissão

Europeia chocado

e surpreendido

IP Bruxelas - Senhor Presidente da Comissão Europeia, José Barroso, obrigado por nos receber no seu

gabinete luxuoso com mobiliário da Moviflor e quadros originais de Kandinsky e Roy Lichtenstein. O que vai fazer perante uma derrapagem orçamental desta envergadura de um país-membro?

PRESIDENTE - Antes de mais, não se trata de uma derrapagem. A Comissão debateu o assunto e elaborou uma outra imagem, que por acaso também é rodoviária.

IP-Qual é?

P - O défice português é como um choque em cadeia com milhares de veículos em chamas dentro de um túnel, durante uma noite de temporal, que impede os meios de socorro de lá chegar durante um alerta de tsunami provocado por um sismo de 9.8 na escala de Richter, que faz os aviões chocar no ar e atira os petroleiros para cima dos bairros habitacionais.

IP - É assim tão grave?

P - Pior. Tem a força destruidora combinada de um milhão de bombas de Hiroshima, com Godzüla, o Festival da Eurovisão e Avelino Ferreira Torres.

IP - Na sua opinião, qual é a origem do problema?

P - Os países do Sul são pouco rigorosos. Abandalham, pronto. Têm maus governos e piores povos. São como uma peritonite gangrenosa a alastrar no nosso esbelto corpo franco-anglo-alemão.

IP - A Alemanha e a França também têm défices elevados.

P - Mas são défices virtuosos.

IP - Por que é que diz isso?

P - Porque gosto do meu emprego.

IP - Vai impor sanções a Portugal?

P - Vou. O vosso Governo tem de aprender que o pacto de estabilidade é como o "Imagine" do John Lennon e o óleo de fígado de bacalhau: provoca repulsa, mas a ideia em si é boa. » MB

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Comissário dos Refugiados

surpreendido

e chocado

IP Genebra - Antes de mais, obrigado por receber o INIMIGO PÚBLICO na sua tenda esburacada com carraças e vírus de Marburgo nas paredes. Senhor Alto-comissário das Nações Unidas para os Refugiados, Gutierrez, ou também conhecido por ACNUR: como recebeu o relatório da Comissão Constâncio?

ACNUR - Por SMS.

IP - Deve ter demorado horas.

ACNUR - Não. Mandaram-me o essencial:"0i. 6,83 na bilha lol Jorge".

IP - Como é que reagiu?

ACNUR - Mandei imediatamente carregamentos maciços de tendas, cobertores, medicamentos, Dostoievski e água potável para a zona afectada.

IP-Para onde? Não chegou lá nada disso.

ACNUR - É natural. Nós não somos a AMI. Não se preocupe. O que não for desviado pelos senhores da guerra (os autarcas) e pelos chefes tribais (SuperLiga), vai estar à venda na Feira do Relógio em 2006.

IP - Um défice desta dimensão é uma catástrofe humanitária?

ACNUR - É. Lamento muito que os países do Sul da Europa continuem a ter péssimos governos e povos inviáveis. Há dias vi a direcção do Sporting, li o “Expresso” e ouvi o disco da irmã do Ronaldo e percebi que o vosso país é o arquétipo da miséria humana, tal como foi definida por Manuela Moura Guedes.

IP-O que é que o ACNUR vai fazer?

ACNUR - O ACNUR vai dar as mãos aos refugiados e estabelecer uma corrente humana de solidariedade mundial ao som do "Imagine" do John Lennon. Também vai propor um programa défice por alimentos.

IP-Como é que isso funciona?

ACNUR - Por cada centésima que o défice baixar, o ACNUR envia uma bolacha energética para a Cova da Beira. MB
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