segunda-feira, outubro 31, 2011

MEMÓRIA DO TEMPO QUE PASSA


Como sempre, recordo:

Este é o espaço em que,
habitualmente,
faço algumas incursões pelo mundo da História.
Recordo factos, revejo acontecimentos,
visito ou revisito lugares,
encontro ou reencontro personalidades e lembro datas.
Datas que são de boa recordação, umas;
outras, de má memória.
Mas é de todos estes eventos e personagens que a História é feita.
Aqui,
as datas são o pretexto para este mergulho no passado.
Que, por vezes,
ajudam a melhor entender o presente
e a prevenir o futuro.

ESTAMOS NA SEGUNDA-FEIRA DIA 31 DE OUTUBRO DE 2011 (MMXI) DO CALENDÁRIO GREGORIANO

Que corresponde ao
Ano de 2764 Ab Urbe Condita (da fundação de Roma)
Ano 4707 a 4708 do calendário chinês
Ano 5771 a 5772 do calendário hebraico
Ano 1432 a 1433 do calendário islâmico

Mais:
DE ACORDO COM A TRADIÇÃO, COM O CALENDÁRIO DA ONU OU COM A AGENDA DA UNESCO:
De 2003 a 2012 - Década da Alfabetização: Educação para Todos.
de 2005 a 2014 - Década das Nações Unidas para a Educação do Desenvolvimento Sustentável.
de 2005 a 2015 - Década Internacional "Água para a Vida".

Por outro lado
2011 é o
ANO EUROPEU DO VOLUNTARIADO
ANO INTERNACIONAL DA QUÍMICA
ANO INTERNACIONAL DAS FLORESTAS

Hoje é o
DIA MUNDIAL DA POUPANÇA.

A semana de 24Out a 31 Out é a
SEMANA DO DESARMAMENTO/SEMANA MUNDIAL DA PAZ



«Não foi do Rei Duarte tão ditoso
O tempo que ficou na suma alteza,
Que assi vai alterando o tempo iroso
O bem co mal, o gosto co a tristeza.»
Camões, Lusíadas, Canto IV, 51

Símbolo da realeza portuguesa da Casa de Avis e descendência

Foi na TR 31.10.1391, há 620 anos, que nasceu, em Viseu, D. Duarte, 11º rei de Portugal, que sucedeu a seu pai, D. João I, no trono.

Na Europa o poder estava assim distribuído:
Em Portugal reinava D. João I (10º), O de Boa Memória, inaugurador da segunda dinastia, Dinastia de Avis.
Rei de Inglaterra era, na altura, Ricardo II (36º), da Casa Plantageneta, neto de Eduardo III, a quem sucedeu.
Rei de França (34º) era Carlos VI, da Dinastia de Valois.
Rei da Germânia (Alemanha) e da Itália era Venceslau I, da Casa de Luxemburgo.
A Espanha, como tal (unidade política) ainda não existia, daí que:
Rei de Leão e Castela (18º) fosse Henrique III, da Dinastia de Trastâmara.
Rei de Navarra (30º) fosse Carlos III, da Casa de Évreux.
E rei de Aragão (15º), João I, da Dinastia de Barcelona.
Aos destinos da igreja de Roma presidia, então, Bonifácio IX (203º), cujo pontificado decorreu ao tempo do grande cisma do Ocidente, em oposição a Clemente VII (antipapa) de Avinhão. Estabeleceu as anatas perpétuas.

Anata era o nome que se dava, no sistema fiscal da cúria pontifícia, ao imposto que se pagava à autoridade eclesiástica, por quem fosse provido em algum benefício ou mercê. Calculava-se pelo rendimento do primeiro ano - donde o nome.
Desde o séc. VI que os Cânones autorizavam os bispos e abades a cobrar a anata pelos benefícios que conferiam aos sacerdotes por eles ordenados. As verdadeiras anatas, designadas por annatae Bonifacianae, consistiam, em síntese, na metade dos rendimentos do primeiro ano...
"Naturalmente, este tributo, em que se manifestava com clareza a vontade monárquica do papado a partir do séc. XIV, levantou oposição nos cleros dos vários Estados; de maneira que, quando, na primeira metade do séc. XV, se iniciou uma violenta reacção das igrejas nacionais contra a tendência unificadora do papado, a questão das anatas tomou relevo." Daí que Martinho V as tenha reduzido (1418); o concílio de Basileia as tenha abolido (1435); a Pragmática Sanção [nome que se dava ao conjunto de normas, de nível superior - ficavam a fazer parte da lei fundamental -, emanadas do poder civil, na sua maioria relacionadas com a ordem eclesiástica] de Bourges, publicada por Carlos VII, de França, em 1438, as tenha suprimido, pura e simplesmente.

Foi bem curto o reinado de D. Duarte, que em pouco ultrapassou os 5 anos, já que, sucedendo a seu pai em 14.08.1433, aos 42 anos, viria a morrer, em Tomar, aos 09.09.1438, com 47 anos incompletos. Aliás, nada faria prever o desenlace do rei tão prematuramente, saudável que ele era. Porém a peste, que a tantos surpreendeu, vitimou-o também a ele inesperadamente.

O “Rei-Filósofo” ou o “Eloquente”, como foi cognominado, era um homem culto e com obra produzida, pois que foi escritor e poeta.

D. Duarte não foi o primogénito de D. João I, embora tivesse sido o mais velho dos seis filhos (entre 8) que vingaram e chegaram à idade adulta e que ficaram conhecidos como a “ínclita geração [dos] altos infantes” – na expressão de Camões (Lusíadas, Canto IV, 50).
Realmente, D. Duarte foi o 3º filho de D. João I e de D. Filipa de Lencastre, depois de Branca (que morreu bebé) e de Afonso (que morreu com cerca de 10 anos). Ou seja, dos filhos varões foi o secundogénito, mas sucessor do pai por ter sobrevivido a seu irmão Afonso, como se viu. A D. Duarte seguiu-se Pedro, Duque de Coimbra (1392-1449), que foi um dos infantes mais esclarecidos do seu tempo e que foi regente durante a menoridade do seu sobrinho, o futuro Rei D. Afonso V, vindo a morrer na Batalha de Alfarrobeira.

«Esta batalha travou-se em 20 de Maio de 1449, junto do ribeiro de Alfarrobeira, em Alverca, entre as tropas do rei D. Afonso V e as do Infante D. Pedro, seu tio [e seu sogro]. Tal batalha é o culminar de uma luta política que vem desde a morte de D. Duarte, em 1438.
D. Afonso V era menor e ficou como regente a mãe, D. Leonor, como D. Duarte pedira. Mas nas cortes de 1439 o Infante D. Pedro fica com a regência e a rainha D. Leonor é exilada em Castela. D. Pedro tem de se impor aos partidários de D. Leonor. Quando D. Afonso V atinge os 14 anos, em 1446, o governo passa para as suas mãos, nas cortes de Lisboa, ficando D. Pedro a auxiliá-lo. Mas a facção contrária, encabeçada pelo duque de Bragança [1º duque de Bragança, D. Afonso, tio bastardo do rei], pelo conde de Ourém e pelo arcebispo de Lisboa, intensifica a sua campanha de intrigas contra D. Pedro, o que leva a que, em 1448, D. Afonso V dispense os serviços do tio. O Infante D. Pedro retira-se para as suas terras de Coimbra, e os seus apoiantes começam a ser perseguidos. (...)
Em conselho, D. Pedro e os seus apoiantes são declarados rebeldes e desleais ao rei, e este prepara-se para os combater, reunindo 16000 homens em Santarém. Ao mesmo tempo, o Infante D. Pedro, com 3500 homens, sai de Coimbra para se vir justificar perante o rei. Ao chegar a Alfarrobeira, a 20 de Maio, encontra as tropas de D. Afonso V. As tropas reais, em maior número, cercam as tropas do Infante D. Pedro. A luta foi breve e dela resultou a morte do Infante D. Pedro, varado por uma seta. Nesta batalha sobressaiu o exemplo do conde de Avranches, que jurara fidelidade a D. Pedro, lutou até à morte, acabando por ser morto, lançando o célebre: "Ora fartar, rapazes. Vingar, vilanagem." Os seus apoiantes foram desbaratados e depois perseguidos. (...)
O significado da Batalha de Alfarrobeira é o da vitória da facção palaciana e senhorial, que influenciava D. Afonso V, e o da derrota da centralização régia, defendida pelo príncipe D. Pedro, e que só triunfará com D. João II.»
(Infopédia online, Porto Editora, sob entrada Batalha de Alfarrobeira)
Isto é: a batalha representou o triunfo da corrente senhorial sobre os princípios da centralização do poder, anunciadores da Idade Moderna.

Dos “altos infantes” seguiu-se D. Henrique, Duque de Viseu, O Navegador (1394-1460), que investiu a sua fortuna em investigação relacionada com navegação, náutica e cartografia; de seguida D. Isabel, Duquesa da Borgonha (1397-1471) que casou com o francês Filipe III (ou Filipe, o Bom), Duque da Borgonha; em seguida o Infante D. João, condestável do reino e avô de Isabel de Castela (Isabel I), já que filha da Infanta Isabel, sua filha; por fim D. Fernando, o Infante Santo, que morreu no cativeiro, em Fez, Marrocos e cuja divisa era «Le bien me plaît».

É com D. Duarte e com o infante D. Pedro, seu irmão, ambos figuras de elevada estatura intelectual, que a nossa língua assume elevada capacidade de expressão conceptual no plano da filosofia, no despontar do século XV.

Mas ouçamos Oliveira Martins: Em 1387 D. João I casa com D. Filipa de Lencastre. «Os primeiros dois anos [após o casamento] foram estéreis; mas logo em 1390 a rainha começou, com uma pontualidade inglesa, a produzir o seu filho anual. Em 1390 nasceu o infante D. Afonso, que morreu de dois anos. Em 1391 (31.10), D. Duarte, que sucedeu a seu pai no trono. Em 1392, D. Pedro, fadado para melancólicos destinos. Em 1393, falha. Em 1394, D. Henrique, o Cipião português [Públio Cornélio Cipião Africano, o Velho, foi um general, estadista e grande estratega romano], inventor do nosso Império ultramarino. Em 1395, D. Branca, falecida na infância. Em 1396, provavelmente, algum desmancho. Em 1397, D. Isabel, que casou com o duque de Borgonha. Depois, a fecundidade cansa: há intervalos. Em 1400 nasce o infante D. João; em 1402, o pobre mártir de Tânger, o infante D. Fernando, Isaac efectivamente imolado por um Abraão terrível, (...). Depois o manancial esgota-se.
Foi o seu último filho. (...)» (Oliveira Martins “Os Filhos de D. João I” -15). O infante D. Fernando (Infante Santo) morreu em 05.07.1443.

Esta enumeração de Oliveira Martins não coincide com a que vimos anteriormente. Contudo, segundo parece foi mesmo uma primeira infanta D. Branca a primogénita, que morreu ainda bebé, como confirma Maria Helena da Cruz Coelho em D. João I, da Colecção Reis de Portugal do Círculo de Leitores, Lisboa, 2005, pg 119, sendo que esta infanta aparece enumerada por Oliveira Martins fora daquela ordem primeiramente referida.

Uma curiosidade a anotar é que, segundo parece, os reis, por estes tempos, pelo menos, não estavam postos em sossego, num “dolce far niente” no seu Paço, na capital. Antes se deslocavam por todo o país, fazendo justiça ou tratando de negócios do reino, e não era a sós que o faziam, mas com rainha, numa espécie de antevisão do que seriam mais tarde, nos nossos dias, as presidências abertas. Alguns exemplos bastam para o exemplificar: dos filhos de D. João I, D. Duarte nasceu em Viseu, seu irmão D. Henrique no Porto, a infanta D. Isabel, sua irmã, em Évora e o infante D. João, igualmente seu irmão, em Santarém. Já dos filhos de D. Duarte, D. Afonso V nasceu em Sintra, enquanto seu irmão D. Fernando, pai de D. Manuel, nasceu em Almeirim e sua irmã D. Leonor, em Torres Vedras.

Em 19.07.1415, que foi numa SX: morre, com 56 anos, a rainha D. Filipa de Lencastre.

D. Filipa de Lencastre nasceu em Inglaterra, em 1359. Era filha primogénita de João de Gant (ou Gaunt) e de D. Branca, duques de Lancaster, e neta do rei Eduardo III, da celebrada dinastia Plantageneta. Casou a 2 de Fevereiro de 1387 com D. João I, na Sé do Porto.
Educada em Inglaterra, numa das propriedades rurais de seu pai, pouco se sabe da sua vida até aos 26 anos. Em 1386 embarcou com seu pai, sua madrasta e sua irmã, D. Isabel, para Castela, sendo então prometida a D. João I, rei de Portugal.

Por influência de D. Filipa novos hábitos e novos costumes, ingleses, se introduziram na corte portuguesa, o que viria a manifestar-se na conduta, na formação moral e até na actividade literária de seus filhos D. Duarte, D. Pedro, D. Henrique e D. Fernando.
D. Filipa promoveu sempre o fortalecimento das relações com Inglaterra, sendo já o seu casamento, aliás, um contributo para a consolidação da aliança luso-britânica, estabelecida em 1372.
Morreria de peste em Odivelas, nas vésperas da partida para Ceuta, não sem antes entregar a cada um dos infantes, D. Duarte, D. Pedro e D. Henrique, a espada com que viriam a ser armados cavaleiros por seu pai, D. João I. Foi sepultada em Odivelas, e, posteriormente, trasladada para o mosteiro da Batalha.

Com Inês Pires D. João I teve mais dois filhos naturais: Afonso, que se tornou no 1º duque de Bragança ao casar-se com a filha de D. Nuno Álvares Pereira, Beatriz Pereira de Alvim, e Beatriz.


D. João I era filho ilegítimo de D. Pedro I e da dama galega Teresa Lourenço. Em 1364 foi proclamado Grão Mestre da Ordem de Avis. Daí a cerca de 20 anos dar-se-ia a crise sucessória de 1383-1385: com a morte do último rei da 1ª dinastia, D. Fernando, Portugal parecia em risco de perder a independência já que a sucessão do trono recaía sobre a sua única filha, D. Beatriz que casara com 11 anos de idade com o rei João I de Castela. De facto a sucessão da filha de D. Fernando e da rainha D. Leonor Teles de Meneses, cuja ligação ao nobre galego João Fernandes Andeiro se tornara pública e notória, acarretando sobre si e seus apoiantes, as antipatias e desconfiança de todos (nobres burguesia e povo) não colhia grandes simpatias. Ninguém, porém, se conformava com tal situação, pelo que concorreram ao trono português, contra D. Beatriz e seu estrangeiro marido, um outro D. João, filho de D. Pedro I e de Inês de Castro, supostamente casados, e o filho natural do mesmo D. Pedro I com Teresa Lourenço, Mestre de Avis, também ele D. João. Como já sabemos o desfecho da História, seguida a crise e pouco mais de um ano de guerra, em 6 de Abril de 1385 o Mestre de Avis é aclamado rei de Portugal, como D. João I, nas Cortes de Coimbra dessa data, onde o jurisconsulto português, João das Regras, desempenhou um papel primordial na defesa da aclamação do Mestre de Avis.
Daí o início da segunda dinastia com D. João I, Mestre de Avis, e donde, também, a designação da dinastia como de Avis.
Os traços característicos do seu perfil físico e moral devem-se, sobretudo, a Fernão Lopes, embora se deva também a seu filho Duarte, “no Leal Conselheiro, no sermão das exéquias ou no epitáfio do Mosteiro da Batalha” (referida obra, D. João I, do CL, pg 10)

Já quanto a D. Duarte, embora curto o seu reinado, nele deu seguimento à política expansionista dos descobrimentos, apoiado que era, por seu irmão, D. Henrique que, de Sagres, onde se estabeleceu com a sua escola de navegação marítima, dirigiu as descobertas. Assim, foi no seu reinado que Gil Eanes dobrou o Cabo Bojador. A passagem do Cabo Bojador tinha quase tanto de mítico e lendário, de maus presságios, como viria ter, mais tarde (1488), a dobragem do Cabo das Tormentas ou da Boa Esperança por Bartolomeu Dias, a passagem do Atlântico para o Índico.

Uma vez que o nome português Duarte é uma variante do Edward inglês, foi em homenagem ao seu bisavô, avô de sua mãe, o rei Eduardo III, que D. Duarte recebeu o seu nome. Aliás, numa pintura representando o rei, na sala dos Capelos da Universidade de Coimbra, o seu nome, aí, é referido por Eduardus I, rex.

D. Duarte foi mesmo preparado para reinar, pois que desde muito jovem acompanhou o pai nos negócios do reino. Desde 1412 (tinha 21 anos) que assim sucedia, tendo mesmo, D. Duarte, participado na conquista de Ceuta (1415), quando foi armado cavaleiro. Nos preparativos da conquista não participou, pois que estava ocupado com outros afazeres. Mas da operação, sim, participou.
D. Duarte era, porém, menos centralizador que o pai, e como se preocupava em gerar consensos, durante os cinco anos que reinou, cinco vezes convocou Cortes para pôr à discussão assuntos de Estado: Santarém, 1433 e 1434, Évora, 1435 e 1436 e Leiria, 1438.

Das primeiras Cortes, que convocou logo um ano após a sua subida ao trono, em 1434, resultou a promulgação da Lei Mental (assim denominada por já ter andado na mente de seu pai, D. João I) e que “determinava que os bens doados pela coroa só podiam ser herdados pelo filho varão primogénito, o que permitiu à Coroa reaver muitas terras” – Enciclopédia online da Porto Editora, entrada: D. Duarte. Por outro lado, como as Cortes, desde o tempo de seu pai, várias vezes tinham solicitado uma colectânea do direito vigente, D. Duarte incumbe dessa tarefa o jurista Rui Fernandes que conclui o seu trabalho em 1446, já após a morte do rei. Entretanto, o irmão deste, infante D. Pedro, mandou rever a obra de que resultaram as Ordenações Afonsinas, por se tratar de obra editada já no reinado d’O Africano (D. Afonso V).

Em 1437, D. Duarte foi convencido pelo seus irmãos Henrique e Fernando a atacar Marrocos, de forma a consolidar a lusa presença (Ceuta já era portuguesa) no norte de África, onde se pretendia estabelecer uma base para a exploração do Atlântico. Mas aqui não houve consenso já que D. Pedro, duque Coimbra e D. João, seus irmãos, estavam contra tal iniciativa: foi aí que se deu o desastre de Tânger cuja derrota, além de custar grandes perdas levou à captura do infante D. Fernando, que viria a morrer em cativeiro por recusar servir de moeda de troca para a devolução de Ceuta.
D. Duarte morreria no ano seguinte, de peste, em Tomar.

Fora do âmbito político, D. Duarte, homem de elevada cultura, tinha ao seu dispor uma importante biblioteca, que «Aires do Nascimento inventariara: livros para auxiliarem as sua tarefas governativas; livros de espiritualidade – numerosos; livros de oração (incluindo o seu belíssimo Livro de Horas);

"Livro de horas é um tipo de manuscrito iluminado comum à Idade Média. Cada livro de horas contém uma colecção de textos, orações e salmos, acompanhado de ilustrações apropriadas, para fazer referência a devoção cristã. Em sua forma original o livro de horas servia como conteúdo de leitura litúrgica para determinados horários do dia. Os livros de horas estão entre os manuscritos medievais mais belos e ricamente ilustrados."
(Wikipédia, entrada: livro de horas)

seis livros de história e outros de guerra; mais ainda de ficção literária; alguma poesia; tratados práticos (livros sobre a agricultura, a astrologia, a lepra, a medicina de Avicena [célebre filósofo e médico persa da Idade Média], a caça de cetraria [ou falcoaria] e de montaria); alguma filosofia, com Aristóteles, Séneca, Cícero; algum direito.»
Não seria, pois, um homem de saber enciclopédico, mas que manifestava curiosidade e interesse por várias áreas do conhecimento.
Ainda acerca da sua biblioteca, apenas um excerto do seu pormenor: «Merlim [personagem do ciclo Arturiano, como sabemos]; Regimento de Princepes; Segredos de Aristóteles; o livro de Galaaz [outro personagem lendário das histórias do ciclo Arturiano, como também se sabe]; O Livro de Cetaria, per castelão (em castelhano); O Livro das Trovas d’El rey D. Deniz; Livro da Corte Imperial; Livro da Lepra, encadernado em purgaminho… etc.» (cfr Luís Miguel Duarte, D. Duarte, colecção Reis de Portugal, Círculo de Leitores, 2005, pg 202)

Como sabemos, D. Duarte escreveu várias obras de poesia e prosa. Destas últimas sobressaem o Leal Conselheiro (ensaio sobre vários temas com especial destaque para a moral e a religião), obra com prólogo e 103 capítulos, uma compilação ou “recolha de textos, de pensamentos, de notas, até de cartas que o rei foi escrevendo em diversos momentos da sua vida” (cit D. Duarte, do CL, p 204). “A reunião dos seus escritos e o afeiçoamento definitivo destes numa obra com unidade, o Leal Conselheiro, ocorreu no último ano ou até nos últimos meses de vida do rei, entre 1437 e Setembro de 1438, como demonstrou o responsável pela melhor edição das duas obras mais conhecidas de D. Duarte, Joseph M. Piel” (ainda op e loc cit de Luís Miguel Duarte).
A outra obra mais conhecida de D. Duarte é o Livro da Ensinança de Bem Cavalgar Toda Sela (que o próprio rei abreviadamente referia como o Livro de Cavalgar). Curiosamente, há um capítulo do Leal Conselheiro escrito para este Livro da Ensinança de Bem Cavalgar Toda Sela que o cit Joseph Piel refere como “o primeiro tratado de equitação da literatura europeia” (op e loc cit). Começado a escrever – devido à sua paixão pela equitação – ainda quando infante, “nos últimos tempos de vida de D. João I o tempo escasseou-lhe” para tal, e depois de uma paragem na sua escrita, durante 4 anos, após a sua subida ao trono, e “já nos derradeiros meses de vida” – que nada fazia prever, mas que a peste acelerou – resolveu retomar e rematar o trabalho, mas à pressa e sem respeitar o plano que meticulosamente preparara para a obra.
Pode e deve referir-se, ainda, como sua obra, o vulgarmente chamado Livro dos Conselhos, um “Livro de Apontamentos”, “que consigo sempre trazia, de coisas familiares e especiais” na expressão do próprio rei. Tratava-se, assim, de “um caderno em branco de que o rei nunca se separava” e em que anotava uma reflexão, a súmula de uma carta que lhe escrevessem ou quaisquer curiosidades.
Ficou conhecido entre os historiadores, este bloco de apontamentos de D. Duarte, como Livro da Cartuxa, por se tratar de livro cuja cópia manuscrita foi oferecida à livraria do convento da Cartuxa, de Évora.
Se a peste não sobreviesse, precipitando-lhe o fim tão prematuro, por certo que o Livro da Cartuxa forneceria muito mais matéria para nova obra de D. Duarte. O seu apontamento mais antigo data de 1423, e o mais recente do ano 1438, em que o rei se finou, o que tudo soma 97 variadíssimas anotações, sobretudo sobre “temas políticos: pareceres e cartas que D. Duarte recebia [e] logo (as) copiava no seu livro”. (Cit D. Duarte, do CL, pg 207/208)

D. Duarte e sua mulher, D. Leonor de Aragão (1402-1455), tiveram 9 filhos do seu casamento (em 1428), dos quais, apenas cinco sobreviveriam à infância. Entre estes contavam-se D. Afonso, futuro D. Afonso V; D. Fernando Duque de Viseu, pai de D. Manuel I; D. Leonor, que casou com Frederico III, do Sacro Imperador Romano-Germânico; e D. Joana que casou com o rei Henrique IV de Castela e foi mãe de Joana de Trastâmara, a Beltraneja (como era conhecida em Castela) ou a Excelente Senhora (como lhe chamou D. João II e era conhecida em Portugal).

Beltraneja atendendo a que seu pai nem tinha nem podia ter filhos – constava -, e que D. Joana (sua mãe) se teria envolvido num romance amoroso com um tal nobre Beltrán de La Cueva, resultando ela dessa união, o que os historiadores, já nos nossos dias, desmentiram. A verdade é que D. Joana (filha, a beltraneja) não deixou de ser considerada ilegítima pelos nobres de Castela, não a reconhecendo como infanta e sucessora no trono. Viria a casar com D. Afonso V, seu tio (em 1475, em segundas núpcias do rei), que se bateu pelos direitos da sobrinha e noiva ao trono de Castela, mas sem êxito, perdendo-o a favor dos reis católicos, tios de D. Joana.

D. Duarte teve ainda um filho natural de uma anterior ligação com Joana Manoel de Vilhena, uma dama da nobreza espanhola: João Manuel, que viria a ser bispo e, que, também ele, por sua vez, deixou dois filhos naturais.

Enfim, o seu reinado, conquanto curto, ficou assinalado por um intenso labor diplomático, numa clara vontade de assegurar a efectiva independência portuguesa, e ainda por um claro intuito de reformar a administração pública, como a convocação anual de Cortes bem demonstrou.





(As fontes desta postagem, para além da habitual consulta de artigos da Net; de diversas entradas da Wikipédia; da Infopédia, a Enciclopédia da Porto Editora e da Biblioteca Universal, a Enciclopédia da Texto Editora, há ainda a acrescentar as seguintes obras: D. João I, de Maria Helena da Cruz Coelho, Colecção Reis de Portugal do Círculo de Leitores, Lisboa, 2005, e D. Duarte, de Luís Miguel Duarte, igualmente da colecção Reis de Portugal, Círculo de Leitores, 2005, além da Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, entradas D. João I e D. Duarte, respectivamente, vol 14, pg 241 e sgs e vol 9, pg 312 e ss; “o Portal da História” e por fim, a obra “Os Filhos de D. João I”, de Oliveira Martins).












segunda-feira, outubro 24, 2011

MEMÓRIA DO TEMPO QUE PASSA


Como sempre, recordo:

Este é o espaço em que,
habitualmente,
faço algumas incursões pelo mundo da História.
Recordo factos, revejo acontecimentos,
visito ou revisito lugares,
encontro ou reencontro personalidades e lembro datas.
Datas que são de boa recordação, umas;
outras, de má memória.
Mas é de todos estes eventos e personagens que a História é feita.
Aqui,
as datas são o pretexto para este mergulho no passado.
Que, por vezes,
ajudam a melhor entender o presente
e a prevenir o futuro.
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ESTAMOS NA SEGUNDA-FEIRA DIA 24 DE OUTUBRO DE 2011 (MMXI) DO CALENDÁRIO GREGORIANO

Que corresponde ao
Ano de 2764 Ab Urbe Condita (da fundação de Roma)
Ano 4707 a 4708 do calendário chinês
Ano 5771 a 5772 do calendário hebraico
Ano 1432 a 1433 do calendário islâmico

Mais:
DE ACORDO COM A TRADIÇÃO, COM O CALENDÁRIO DA ONU OU COM A AGENDA DA UNESCO:
De 2003 a 2012 - Década da Alfabetização: Educação para Todos.
de 2005 a 2014 - Década das Nações Unidas para a Educação do Desenvolvimento Sustentável.
de 2005 a 2015 - Década Internacional "Água para a Vida".

Por outro lado
2011 é o
ANO EUROPEU DO VOLUNTARIADO
ANO INTERNACIONAL DA QUÍMICA
ANO INTERNACIONAL DAS FLORESTAS


Hoje é o
DIA NACIONAL DA ZÂMBIA.
DIA DAS NAÇÕES UNIDAS
DIA MUNDIAL DA INFORMAÇÃO SOBRE O DESENVOLVIMENTO
DIA EUROPEU DA JUSTIÇA CIVIL

E esta semana
de 24Outubro a 31 Outubro – é a
SEMANA DO DESARMAMENTO/SEMANA MUNDIAL DA PAZ



Mas já o Príncipe Afonso aparelhava
O Lusitano exército ditoso
Contra o Mouro, que as terras habitava
D'álém do claro Tejo deleitoso.
Já no campo de Ourique se assentava,
O arraial soberbo e belicoso
Defronte do inimigo Sarraceno,
Posto que em força e gente tão pequeno.
Camões



Na SX 24.10.1147, há 864 anos, deu-se a conquista de Lisboa aos mouros por D. Afonso Henriques e suas forças militares, auxiliado pelos cruzados, então de passagem por Lisboa.


A Europa política estava, na altura, assim constituída:
Em Portugal, como ficou dito, reinava o seu primeiro rei, D. Afonso Henriques, O Conquistador, da Dinastia de Borgonha ou Afonsina.
Monarcas dos reinos cristãos formadores da futura Espanha eram: em Leão, Castela e Galiza, Afonso VII (19), O Imperador, da Dinastia de Borgonha.
Rei de Navarra era Garcia IV (14) da Casa de Aragão e Dinastia Jiménez.
Rainha de Aragão era Petronila (6), a Imperatriz, igualmente da Casa de Aragão e Dinastia Jiménez.
Rei da Alemanha (Germânia) era Conrado III, da Casa de Hohenstaufen.
Em França reinava Luís VII (21), O Jovem, da Dinastia Capetiana.
Pontificava Eugénio III (167º) durante o pontificado do qual se realizou a segunda cruzada (1147-1149), por ele proclamada e pregada por S. Bernardo. Foi este papa que fundou o Sacro Colégio (senado do pontífice romano que o aconselha e auxilia no governo da Igreja).


Segundo antiga lenda, Lisboa foi fundada por um herói mítico Ulisses (Odisseu, em grego), que é a figura central de uma das obras do poeta grego Homero, a Odisseia (a outra foi a Ilíada) que, segundo se crê, será do século VIII a.C.
A epopeia acompanha os eventos da viagem de Ulisses, rei de Ítaca, ao voltar da guerra de Tróia.

Reza ainda a velha tradição que Ulisses, ao passar pelo litoral atlântico da Península Ibérica, teria fundado a cidade depois chamada "Olisipo". Aliás, Ptolomeu, cientista grego que viveu na Alexandria (Egipto) calcula-se que no primeiro século, chamou a cidade de "Oliosipon".

“Cerca 205 a.C. Olisipo [o nome romano da cidade Lisboa, para cujos habitantes, curiosamente, ainda hoje, em lugar de lisbonenses se utiliza mais olisiponenses], alia-se aos Romanos. É absorvida no Império e recompensada pela atribuição da Cidadania Romana aos seus habitantes, um privilégio raríssimo na altura para os povos não italianos. Felicitas Julia Olisipo, como a cidade viria a ser reconhecida, beneficia do estatuto de Município Romano, juntamente com os territórios em redor, até uma distância de 50 quilómetros, e não paga impostos a Roma, ao contrário de quase todos os outros castros e povoados autóctones, conquistados. É incluída com larga autonomia na província da Lusitânia, cuja capital é Emerita Augusta, a actual Mérida (na Estremadura espanhola).” (in
Cidade de Lisboa-História Breve, apud site Tripod.com)



Olisipo situava-se na
província romana da Lusitânia

No fim do domínio romano, Olisipo seria uma dos primeiros núcleos a acolher o cristianismo.

Descobertas arqueológicas feitas perto do Castelo de S. Jorge e da Sé de Lisboa comprovam que a cidade terá sido colonizada pelos fenícios cerca de 1200 a.C.
E, então, outra teoria diz que os fenícios fundaram aqui uma colónia, chamada Alis Ubba, que significa "enseada amena" em fenício. Essa colónia estendia-se na colina onde hoje estão o Castelo e a Sé, até ao rio Tejo, que chamavam Daghi ou Taghi, significando "boa pescaria" em fenício. Porém, com o desenvolvimento de Cartago, também ela uma colónia fenícia, o controlo de Alis Ubba passou para essa cidade.

O magnífico porto proporcionado pelo estuário do rio Tejo transformou a cidade na solução ideal para ser base logística dos navios fenícios destinados às ilhas do Norte que assinalam, ao largo da Cornualha, os confins ocidentais do Canal da Mancha com o Oceano Atlântico, a que os fenícios chamavam Ilhas do Estanho.

“Fenícia foi uma antiga civilização cujo epicentro se localizava no norte da antiga Canaã, ao longo do litoral dos actuais Líbano, Síria e norte de Israel. A civilização fenícia foi uma cultura comercial marítima empreendedora que se espalhou por todo o mar Mediterrâneo durante o período que foi de 1500 a.C. a 300 a.C. Os fenícios realizavam comércio através da galé, um veículo movido a velas e remos (…).”
Sua civilização estava organizada em cidades-estado, de maneira semelhante à Grécia Antiga; cada uma destas constituía uma unidade política independente, que frequentemente se entravam em conflito e podiam dominar umas as outras - embora também colaborassem através de ligas e alianças. Os fenícios foram a primeira sociedade a fazer uso extenso, a nível estatal, do alfabeto. O alfabeto fonético fenício é tido como o ancestral de todos os alfabetos modernos, embora não representasse as vogais (que foram adicionadas mais tarde pelos gregos). Os fenícios falavam o idioma fenício, que pertence ao grupo canaanita da família linguística semita. Através do comércio marítimo, os fenícios espalharam o uso do alfabeto até o Norte da África e Europa, onde foi adoptado pelos antigos gregos, que o passaram aos etruscos, que por sua vez o repassaram aos romanos.

Entretanto, vieram os celtas que se misturaram com os iberos locais, dando origem às tribos de língua celta da região.

(Neste enredos, o entretanto não significará um momento próximo de outro. Não: entre eles podem decorrer séculos ou milénios)

“Celtas é o gentílico ou etnónimo que designa o conjunto de povos organizados em múltiplas tribos e pertencentes à família linguística indo-europeia que se espalhou pela maior parte do oeste da Europa a partir do segundo milénio a.C. Boa parte da população da Europa ocidental pertencia às etnias celtas até à conquista daqueles territórios pelo Império Romano.” (In Wikipédia: Celtas)

«O povo celta invadiu a região no primeiro milénio a.C. e através de casamentos tribais com os povos ibéricos pré-romanos aumentaram o número de falantes da língua celta na região. A povoação pré-romana de Olisipo teve origem nos séculos VIII-VII a.C., assentava no morro e na encosta do Castelo. A Olisipo pré-romana foi o maior aglomerado populacional da região de Portugal, estimando-se que a sua população rondasse entre os 2.500 e os 5.000 habitantes. Olisipo seria um local de aportagem para o tráfego marítimo e comércio com os fenícios. Realmente, achados arqueológicos sugerem que já havia trocas comerciais com os Fenícios na região em 1200 a.C., o que leva alguns historiadores a admitir que os fenícios teriam habitado o que é hoje o centro da actual cidade, na parte sul da colina do castelo.» (Wkipédia: Lisboa)

A Grécia Antiga teve, provavelmente na foz do Tejo, uma base comercial durante algum tempo, mas os conflitos que teve com os Cartagineses levaram ao seu abandono.
Depois Roma conquistou Cartago, e a partir de então os romanos iniciam as guerras de pacificação do Ocidente.

Os (3) conflitos armados que opuseram Roma à República de Cartago, cidade-estado fenícia, entre 264 a.C. e 146 a.C., que tiveram como resultado a conquista de Cartago pelos romanos, a História regista-as como Guerras Púnicas (púnicos era o nome dado aos cartagineses pelos romanos).

Recorde-se que após as guerras púnicas Cartago foi destruída, passando Roma a dominar o Mediterrâneo

Lisboa foi conquistada pelos mouros provenientes do Norte de África, no ano 719. Em árabe chamavam-lhe al-Lixbûnâ. E com a ocupação muçulmana (719-1147) construiu-se a Cerca Moura (ainda hoje um largo com o mesmo nome, ali à Graça, no alto de Alfama), nesse tempo destacando-se no seu interior a alcáçova (sua principal fortaleza) e a medina (a parte mais antiga da cidade, em sítio elevado e com castelo). A Lisboa mourisca desenvolveu-se com a construção de novos bairros, intra e extramuros, num tecido espontâneo e anárquico de ruas sinuosas e estreitas, num percurso labiríntico ainda existente no Bairro de Alfama

“Durante a Idade Média e, por extensão, nas lendas e narrativas populares cristãs, os muçulmanos eram também designados como sarracenos (e também por mouros, embora este último termo designasse mais correctamente os muçulmanos naturais do Magrebe que se encontravam na Península). (Wikipédia: Islão)

O Magrebe ou Magreb, que significa, em árabe noroeste da África, é uma região africana que abrange, em sentido estrito, Marrocos, Sahara Ocidental, Argélia e Tunísia (Pequeno Magreb ou Magreb Central). O Grande Magreb inclui também a Mauritânia e a Líbia. Na época do Império Romano, era conhecido como África menor.
A União do Magrebe Árabe foi criada em 17 de Fevereiro de 1989, através do Tratado de Marraquexe, assinado na cidade marroquina do mesmo nome. Os Estados-membros são: Argélia, Tunísia, Líbia, Marrocos e Mauritânia.

Só mais de 400 anos depois os cristãos a reconquistaram graças ao primeiro rei de Portugal, D. Afonso Henriques, e ao seu exército de portugueses e cruzados, em 24.10.1147. O primeiro rei português concedeu-lhe foral em 1179. A cidade tornou-se capital do Reino em 1255 devido à sua localização estratégica. (Site Tripod.com: Cidade de Lisboa-História Breve)

A primeira tentativa de Afonso Henriques de conquistar al-Ushbuna deu-se em 1137 mas redundou num fracasso. Em 1140 aproveita uma primeira passagem de cruzados por Portugal para novo ataque que novamente falha.



Conquista de Lisboa, da autoria de Roque Gameiro

Assim, D. Afonso Henriques, só sete anos depois, com início «em Junho e Julho de 1147 [alguns sustentam ter o começo da operação sido no 1º de Julho], com a ajuda de uma força mais numerosa de cruzados, cerca de 164 barcos cheios de homens, consegue ser bem sucedido. Enquanto as suas forças portuguesas atacavam pela terra, os cruzados na sua maioria ingleses e normandos, aliciados pelas promessas de pilhagem livre, montaram as suas máquinas de cerco, como catapultas e torres, e atacavam simultaneamente pelo mar e impediam a chegada de reforços vindos do sul. Nos primeiros encontros os muçulmanos vencem os cristãos matando muitos, e a moral dos cruzados fica afectada, ocorrendo vários conflitos sangrentos entre os vários grupos de cristãos.
Conta a lenda que, após muitas tentativas, uma das portas é arrombada e o português Martim Moniz consegue mantê-la aberta com o próprio corpo permitindo que os seus companheiros entrassem, ainda que morrendo esmagado por ela.» (Wikipédia: História de Lisboa)



Episódio do acidente de Martim Moniz

Aquando da tomada de Lisboa aos mouros, em 1147, existia um bispo moçárabe (cristão sob domínio muçulmano) em Lisboa.
Depois da conquista, a diocese foi refeita, ficando por seu bispo o inglês D. Gilberto, vindo com os cruzados: Lisboa ficaria oficialmente ligada (sufragânea) à arquidiocese de Compostela até ao fim do século XIV. Construiu-se a Sé, no local onde fora a mesquita e talvez antes a Sé visigoda, sendo o único monumento românico que resta na capital.


Existe discrepância de datas, entre os autores, acerca da data em que Lisboa terá caído em poder de D. Afonso Henriques: segundo uns, terá sido na Sexta-feira 24 de Outubro, segundo outros, no dia seguinte, Sábado 25, desse ano de 1147.
Uma coisa é certa: a conquista de Lisboa não foi um passeio do nosso primeiro rei; não foi chegar, ver e vencer. Nada disso.

«Estando perto de completar os 38 anos de idade, e já casado com uma princesa que não era de sangue real, mas cuja família se ligara directamente à do rei de França, considerado como verdadeiro rei pelos seus súbditos e pelo próprio imperador da Hispânia, apresentando-se sempre como descendente do glorioso rei Afonso VI, Afonso Henriques não podia, no entanto, esquecer que o seu reino era um país bem modesto quando comparado com a maioria das nações da Cristandade. Não podia esquecer que o papa aceitara o censo que lhe oferecia como “cavaleiro de S. Pedro”, mas o considerava um simples dux [comandante militar]. Para poder satisfazer as suas ambições, precisava de alargar o seu território, de dominar mais cidades além de Coimbra e Braga, e de consolidar, por algum grande feito militar, o prestígio que queria alcançar como extraordinário exterminador dos inimigos da cruz de Cristo. A conquista de Santarém e de Lisboa veio preencher essas ambições.» (in D. Afonso Henriques, de José Matoso, Círculo de Leitores, colecção Reis de Portugal, Lisboa, 2006, pg167)

O cerco foi objecto de um relato que constituiu um importante testemunho presencial dirigido ao cruzado Osberno, feito, por certo, por um padre inglês ou normando que integrava as hostes que se dirigiam da Grã-Bretanha para a Terra Santa e que interromperam a viagem para auxiliarem D. Afonso Henriques na tomada de Lisboa.
(in Infopédia online da Porto Editora; entrada Osberno)

Nesta operação, D. Afonso Henriques além de comandar o exército constituído por entre 12 e 16 mil portugueses e 13 mil cruzados que constituíam a guarnição de 164 navios, era ainda seguido pelo seu séquito: várias importantes figuras das suas casas civil e militar, como Fernão Mendes, Fernão Cativo, Gonçalo Rodrigues, Martim Moniz, Paio Delgado, Pêro Viegas ou Pêro Paz, Gocelino de Sousa e outros mais como Mendo Afonso de Refoios, Múcio de Lamego, Pedro Plágio, ou Pais da Maia, João Rainho, ou Ranha, e outros de que não ficou registo mas estavam lá – romanceia Saramago, mas neste ponto descrevendo a realidade (História do Cerco de Lisboa, José Saramago, Editorial Caminho, 1989, pg138).
Aliás, o seu real séquito, nesta conquista, era ainda integrado pelos bispos de Braga, D. João Peculiar e do Porto, D. Pedro Pitões (id).



História do Cerco de Lisboa

Bem pouco cristã e apostólica a participação, por certo activa, de Suas Excelências Reverendíssimas nesta carnificina que sempre constituíam tais operações…

O início mais remoto do Cerco e Conquista de Lisboa dá-se em 1 de Julho desse ano de 1147, inscrevendo-se no processo mais alargado da reconquista cristã da Península Ibérica.
Como já se referiu, D. Afonso Henriques foi nesta acção auxiliado por cruzados em trânsito para a Terra Santa. Partidos do Norte, as forças portuguesas progridem no terreno enquanto os cruzados avançam pelo mar, até à foz do Tejo, onde se reúnem, depois de D. Afonso Henriques, de passagem, ter conquistado Santarém.

Ficticiamente, ou não, como surge na cabeça do revisor Raimundo Silva, o protagonista do “Cerco…” de Saramago,
é bem possível admitir que “D. Afonso Henriques tenta convencer os cruzados a fazerem a operação pelo mais barato ao dizer supõe-se que com expressão inocente, Duma coisa, porém, estamos certos, e é que a vossa piedade vos convidará mais a este trabalho e ao desejo de realizar tão grande feito, do que vos há-de atrair à recompensa a promessa do nosso dinheiro. (In Op e aut cits pp 128)
A soldadesca, pelo menos, já o vimos acima, contentava-se com a possibilidade de livres saques e pilhagens.

Os primeiros confrontos deram-se nos arrabaldes a Oeste da colina sobre a qual se erguia a cidade de então, hoje a chamada Baixa. E depois de outros violentos combates, tanto esse arrabalde, como o a Leste, foram dominados pelos cristãos, impondo-se dessa forma o cerco à rica cidade mercantil. Bem defendidos, os muros da cidade pareciam inexpugnáveis. As semanas se passavam em acções defensivas dos sitiados, enquanto as máquinas de guerra dos sitiantes lançavam toda a sorte de projécteis sobre os defensores, aumentando o número de mortos e feridos dum lado e doutro.

Subindo à muralha do lado de S. Vicente, lá está o cabeço da Graça enfrentando-se com a torre mais alta, e o rebaixo para o Campo de Santa Clara onde assentou arraiais D. Afonso Henriques com os seus soldados. (Saramago, op cit, 134)

“No início de Outubro, os trabalhos de sapa sob o alicerce da muralha tiveram sucesso em fazer cair um troço dela, abrindo uma brecha por onde os sitiantes se lançaram, denodadamente defendida pelos defensores. Por essa altura, uma torre de madeira construída pelos sitiantes foi aproximada da muralha, permitindo o acesso ao adarve” [estreito passeio ao longo do alto das muralhas]. Perante esse acesso, e na iminência de um assalto das forças cristãs em duas frentes, “os muçulmanos, enfraquecidos pelas escaramuças, pela fome e pelas doenças, capitularam a 24 de Outubro. Entretanto, somente no dia seguinte, o soberano e suas forças entrariam na cidade, nesse meio tempo violentamente saqueada pelos Cruzados. Após a rendição uma epidemia de peste assolou a região fazendo milhares de vítimas entre a população. Lisboa tornou-se, entretanto, capital de Portugal a 1255”, como já antes se disse. (Fonte: Wikipédia: “Cerco de Lisboa (1147)”)

O cerco, propriamente, demorou vários dias, pelo menos uns dez. E, como já relatado, houve muita escaramuça, vários combates, diversas tentativas, muitas operações: provocação de desmoronamentos das muralhas, construção de uma torre móvel… E mortes: nomeadamente a de Martim Moniz, entalado, segundo reza a lenda, numa das portas da cidade (que dava, exactamente, para o que hoje se chama o Largo do Martim Moniz), para que as tropas de D. Afonso Henriques, e os cruzados, que as reforçavam, pudessem entrar. Houve, nomeadamente, negociações com vista à rendição definitiva e total dos mouros.

quinta-feira, outubro 20, 2011

MEMÓRIA DO TEMPO QUE PASSA

Como sempre, recordo:

Este é o espaço em que,
habitualmente,
faço algumas incursões pelo mundo da História.
Recordo factos, revejo acontecimentos,
visito ou revisito lugares,
encontro ou reencontro personalidades e lembro datas.
Datas que são de boa recordação, umas;
outras, de má memória.
Mas é de todos estes eventos e personagens que a História é feita.
Aqui,
as datas são o pretexto para este mergulho no passado.
Que, por vezes,
ajudam a melhor entender o presente
e a prevenir o futuro.

.
ESTAMOS NA QUINTA-FEIRA DIA 20 DE OUTUBRO DE 2011 (MMXI) DO CALENDÁRIO GREGORIANO

Que corresponde ao
Ano de 2764 Ab Urbe Condita (da fundação de Roma)
Ano 4707 a 4708 do calendário chinês
Ano 5771 a 5772 do calendário hebraico
Ano 1432 a 1433 do calendário islâmico

Mais:
DE ACORDO COM A TRADIÇÃO, COM O CALENDÁRIO DA ONU OU COM A AGENDA DA UNESCO:
De 2003 a 2012 - Década da Alfabetização: Educação para Todos.
de 2005 a 2014 - Década das Nações Unidas para a Educação do Desenvolvimento Sustentável.
de 2005 a 2015 - Década Internacional "Água para a Vida".

Por outro lado
2011 é o
ANO EUROPEU DO VOLUNTARIADO
ANO INTERNACIONAL DA QUÍMICA
ANO INTERNACIONAL DAS FLORESTAS



... foi tanta a lágrima de todos que neste dia tomou aquela praia [Restelo] posse das muitas que nela se derramaram, na partida das armadas que cada ano vão a estas partes que Vasco da Gama ia descobrir; donde com razão, lhe podemos chamar praia de lágrimas para os que vão, terra de prazer aos que vêm.
João de Barros




Retrato de João de Barros

Foi na SX 20.10.1570, há 441 anos: morreu o historiador e pedagogo João de Barros (c. 1496-1570), autor das “Décadas da Ásia”. Apelidado o Tito Lívio português, é geralmente considerado o primeiro grande historiador português.

Tito Lívio (c. 59 a.C. — Pádua, 17) é o autor da obra histórica intitulada Ab urbe condita ("Desde a fundação da cidade"), onde tenta relatar a história de Roma desde o momento tradicional da sua fundação 753 a.C. até ao início do século I (ano 9) da era comum. Deles contemporâneo, manteve-se isolado da política e do círculo de literatos que rodeava o imperador e que incluía os grandes poetas Virgílio, Horácio e Ovídio, preservando a sua independência. (Wikipédia)

Nessa altura o poder, na Europa, estava assim constituído:
Em Portugal reinava D. Sebastião (16º).
Em Inglaterra e Irlanda reinava a Rainha Virgem, cognome de Isabel I, filha de Henrique VIII e de Ana Bolena, e (meia) irmã consanguínea de Maria I, a quem sucedeu – todos da Dinastia Tudor.
Em França reinava Carlos IX (42) da Dinastia de Valois.
Imperador do Sacro Império Romano-Germânico era Maximiliano II (33), O Culto ou O Tolerante, da Casa dos Habsburgos, e simultaneamente rei da Itália.
Em Espanha decorria o reinado de Filipe II O Prudente (que viria pouco depois a ser também Filipe I de Portugal), da Casa dos Habsburgo/Casa de Áustria.
Pontificava Pio V (225º), cuja Bula Ad Regiae Majestatis (de 18AGO1570) regulando certos assuntos relacionados com a Ordem de Cristo, assim como com as ordens de Santiago e de Avis, aboliu e revogou todos e quaisquer privilégios, dispensas e isenções concedidos àquelas ordens, dando ao rei, como seu mestre, e a todos os seus sucessores, faculdade para relaxar, moderar e acrescentar tudo o que fosse a bem delas” - respiguei da Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira/GEPB, vol 19, pág 571, cujo texto continua: "Os privilégios das ordens começaram a ser notavelmente cerceados durante o séc. XVIII, obra que foi prosseguida pelos revolucionários de 1820 e contra a qual reagiu em vão a contra-revolução da vilafrancada (1823). Restabelecido o constitucionalismo, um diploma de 30.06.834 declarou que o decreto de 30.05.834, pelo qual se extinguiram os conventos religiosos, compreendia também as ordens militares e lhes era aplicável em todas as suas disposições."



Nas suas obras, João de Barros revela ser um homem de sólida cultura, espelho do pensamento humanista português, até pela defesa do figurino elogioso da expansão ultramarina portuguesa, afinal tão pouco conforme com os correlativos valores mais enraizados do humanismo europeu. Além de que “adoptou um estilo grave, semeado de hipérboles que anunciam Os Lusíadas, em longos períodos alatinados” (in Infopédia [Em linha]. Porto Editora).

Como historiador e quanto ao rumo ideológico, João de Barros adopta o figurino oficial, encarando a expansão ultramarina numa perspectiva cruzadística contra o inimigo tradicional, o Islão. E também concebe a narrativa histórica num sentido exaltante de figuras e feitos heróicos, pelo que os traços negativos da actuação portuguesa são intencionalmente preteridos da narrativa. Nesse aspecto, segue as pisadas de Gomes Eanes de Zurara, com uma visão aristocratizante da história, muito longe, ambos, da concepção de raiz mais popular de Fernão Lopes

Gomes Eanes de Zurara (1410-1474) (ou Gomes Eanes de Azurara) foi cronista e Guarda-Conservador da Livraria Real, por volta de 1451. Como foi, depois de Fernão Lopes, em 1454, Guarda-Mor da Torre do Tombo. Nas suas crónicas, sem pôr de lado a probidade, Zurara fixa-se na apreciação das grandes figuras, sublinhando heroísmo e feitos paradigmáticos, exaltando o valor das épicas personagens de que se ocupa. Nos seus escritos, Zurara está para o seu antecessor, Fernão Lopes, como a crónica dos heróis estará para a crónica de um povo. Em 1450 escreveu a "Chronica del Rei D. Joam I de boa memória, terceira parte em que se contam a Tomada de Ceuta" (publicada em Lisboa, em 1644) – acompanhada, de perto, a Wikipédia

“Fernão Lopes (c. 1378-c. 1459) foi funcionário do paço e notário, nomeado em 1434 Cronista-Mor pelo rei D. Duarte, escreveu as crónicas dos reis D. Pedro I, D. Fernando e D. João I (1.ª e 2.ª partes). Do ponto de vista da forma, o seu estilo representa uma literatura de expressão oral e de raiz popular. Ele próprio diz que nas suas páginas não se encontra a formosura das palavras, mas a nudez da verdade. Era um autodidacta. (…) Ocupa, entre a série dos cronistas gerais do Reino, um lugar de destaque, quer como artista quer pela sua maneira de interpretar os factos sociais. (…) Em 1418 já ocupava funções públicas de responsabilidade (era Guardião-mor das escrituras da Torre do Tombo). Pertencia portanto à geração seguinte à que viveu o cerco de Lisboa e na batalha de Aljubarrota. A guerra com Castela acabou em 1411, pelo que Fernão Lopes pôde ainda acompanhar a sua fase, e conhecer pessoalmente alguns dos seus protagonistas, como D. João I, Nuno Álvares Pereira, os cidadãos de Lisboa que se rebelaram contra D. Leonor Teles e elegeram o Mestre de Avis seu defensor em comício popular, alguns dos procuradores às Cortes de Coimbra de 1385 que, apoiando o dr. João das Regras declararam o trono vago e, chamando a si a soberania, elegeram um novo rei e fundaram uma nova dinastia. Profissionalmente, Fernão Lopes era um tabelião (…) Foi empregado da família real e da corte, escrivão de D. Duarte, ainda infante, do rei D. João I, e do infante D. Fernando, em cuja casa ocupou o importante posto de «escrivão da puridade», que correspondia ao cargo de maior confiança pessoal concedido pela alta nobreza. A partir de 1418 aparece a desempenhar as funções de Guarda-mor da Torre do Tombo, encarregado de guardar e conservar os arquivos do Estado, lugar de confiança da Corte. (…) Fernão Lopes viveu uma das épocas mais perturbadas da história de Portugal, cheia de ensinamentos para o historiador. (…).” (Wikipédia)

Escrivão da puridade: Designação atribuída no século XIII ao escrivão responsável pelos documentos particulares do rei. Era, assim, um homem de confiança dos monarcas. No reinado de D. Pedro I, este funcionário passou a ser detentor do Selo de Camafeu ou Selo da Puridade, que permitia autenticar documentos régios, sem necessidade de passar pela chancelaria [repartição onde altos funcionários da coroa desempenhavam funções semelhantes às dos actuais primeiros-ministros]. Era da sua competência tudo o que dissesse respeito a Cortes, bem como os negócios exteriores. O cargo foi restaurado já no século XVII, por D. Afonso VI, que o atribuiu ao conde de Castelo Melhor. Com a queda deste ministro, o cargo foi extinto. (In Infopédia online)

Mas João de Barros, além de se tratar do primeiro grande historiador português, é considerado pioneiro da gramática da língua portuguesa, tendo escrito a segunda obra a normatizar a língua, tal como falada no seu tempo. Filho de um nobre, o corregedor de entre Tejo e Guadiana, Lopo de Barros, foi educado na corte de D. Manuel I, na época de maior apogeu dos descobrimentos portugueses, e também serviu no Paço real ao tempo de D. João III. Iniciou a sua fecunda carreira literária muito jovem, com pouco mais de vinte anos, com um romance de cavalaria, a “Crónica do Emperador Clarimundo” (1522), de quem descenderiam os reis portugueses, dedicado ao soberano (D. Manuel) e ao príncipe herdeiro (futuro D. João III). Este, ao subir ao trono em 1521, atribuiu-lhe o cargo de capitão da fortaleza de São Jorge da Mina, para onde partiu no ano seguinte.

O Castelo da Mina ou Feitoria da Mina, mais tarde designado por Fortaleza de São Jorge da Mina, fica situado na actual cidade de Elmina, no Gana (Golfo da Guiné, na costa ocidental da África). Esta feitoria foi estabelecida em 1482 com vista a controlar e defender o comércio do ouro e a navegação dos portugueses nessa região.

Depois tem uma passagem pela Casa da Índia, como tesoureiro, entre 1525 e 1528. Entretanto a peste negra (1530) levou-o a refugiar-se na sua quinta da Ribeira de Alitém (Pombal), onde escreveu (em 1532) o diálogo moral Rhopicapneuma ou Mercadoria Espiritual (1532), prosa filosófica, onde alia com mestria uma apologética cristã e uma sátira à sociedade portuguesa. Regressado a Lisboa nesse mesmo ano, o rei nomeou-o tesoureiro das casas da Índia, da Mina e de Ceuta e depois, entre 1533 e 1567, feitor da Casa da Índia - posição de grande destaque e responsabilidade, numa Lisboa que era então a placa giratória, a nível europeu, para todo o comércio estabelecido com o oriente. João de Barros provou ser um administrador bom e desinteressado, algo raro para a época, como demonstra o surpreendente facto de ter amealhado pouco dinheiro com este cargo (quando os seus antecessores haviam adquirido grandes fortunas).

Parece confirmar-se que a corrupção, seus componentes e derivados, é tão velha como o mundo, o que não obsta a que se identifiquem, se persigam e se punam os seus promotores e beneficiários até aos confins do mundo e dos tempos…



O Paço da Ribeira onde a Casa da Índia estava localizada.
Perpendicular ao rio Tejo, possuía uma torre central e um terraço frente ao rio.
À esquerda vê-se o estaleiro (Ribeira das Naus), com alguns navios em construção.
A área aberta à direita é o Terreiro do Paço, com o porto e um pelourinho
(gravura de Braun e Hogenberg. Civitates Orbis Terrarum, 1572) (Apud Wikipédia)

Em 1534 D. João III, procurando atrair colonos para se estabelecerem no Brasil e simultaneamente evitar as tentativas de penetração francesa, dividiu a colónia em capitanias hereditárias, segundo um sistema já utilizado, e de resultados comprovados, nos Açores, na Madeira e em Cabo Verde. No ano seguinte João de Barros foi agraciado com a posse de duas capitanias, em parceria com Aires da Cunha, o Ceará e o Pará. Constituiu a expensas suas uma armada de dez navios e novecentos homens, que zarpou para o Novo Mundo em 1539. Devido talvez à ignorância dos seus pilotos, a frota não atingiu o objectivo pretendido, tendo andado à deriva até aportar às Antilhas espanholas. Esta operação fê-lo enfrentar graves problemas financeiros até ao fim dos seus dias. Pouco depois da desastrosa expedição ao Brasil, em 1540, publicou a Gramática da Língua Portuguesa com os Mandamentos da Santa Madre Igreja e diversos diálogos morais - Diálogo da Viciosa Vergonha (1540), Diálogo sobre Preceitos Morais (1540) e Diálogo Evangélico sobre os Artigos da Fé (1543), contra o Talmude dos Judeus, obra que, juntamente com a sua crítica à forma como eram tratados e evangelizados os cristãos-novos, levaria à sua perseguição por parte da Inquisição.

Conhecedor da obra dos humanistas europeus, exalta um dos seus lídimos representantes, Erasmo de Roterdão e o seu Elogio da Loucura

Com o objectivo do ensino da língua materna, a Grammatica foi a segunda obra a normatizar a língua portuguesa, tal como falada no seu tempo, como já antes referido – precedida apenas pela de Fernão de Oliveira, impressa em 1536. Foi no entanto considerada a primeira obra didáctica ilustrada no mundo. Pouco depois, por sugestão e proposta do próprio D. Manuel I, iniciou a escrita de uma história que narrasse os feitos dos portugueses na Índia – de que resultou a sua obra mais destacada: as Décadas da Ásia (Ásia de Ioam de Barros, dos feitos que os Portuguezes fizeram na conquista e descobrimento dos mares e terras do Oriente), assim chamadas por, à semelhança da história liviana, agruparem os acontecimentos por livro em períodos de dez anos. 

Assim, o Volume I, ou primeira década, saiu em 1552, o II (1553), o III (1563) e o IV (1615). A quarta década, porém, deixou-a inacabada, tendo sido completada por João Baptista Lavanha e publicada em Madrid no referido ano de 1615, 45 anos depois da sua morte. 

Apesar do seu estilo fluente e rico, as "Décadas" despertaram pouco interesse durante a sua vida. E se medirmos a sua projecção em termos de traduções de que tenham sido objecto, as "Décadas" apenas conheceram uma tradução, italiana, em Veneza, em 1563. Mas D. João III, entusiasmado com o seu conteúdo, pediu a João de Barros que redigisse uma crónica relativa aos acontecimentos do reinado de seu pai, D. Manuel - o que ele não pôde realizar, tendo essa crónica sido escrita por outro grande humanista português, Damião de Góis.

“Damião de Góis (1502-1574) foi um historiador e humanista português, relevante personalidade do renascimento em Portugal. De mente enciclopédica, foi um dos espíritos mais críticos da sua época, verdadeiro traço de união entre Portugal e a Europa culta do século XVI.” (Wikipédia)

Diogo do Couto foi encarregado mais tarde de continuar as suas "Décadas", adicionando-lhe mais nove (incluindo a IV). A primeira edição completa das 12 décadas surgiu em Lisboa, já no século XVIII (1778-1788).

Diogo de Couto (1542-1616), outro historiador português, teve a particularidade de ser amigo de Camões, que foi encontrar na Ilha de Moçambique, em 1569, crivado de dívidas e sem dinheiro para regressar a Portugal, o que conseguiu com a ajuda de Diogo de Couto e outros amigos, em 1570, para apresentar a D. Sebastião a sua obra maior - os Lusíadas. (Id)

Aliás, foi do rei Filipe I que Diogo de Couto recebeu a incumbência de prosseguir as "Décadas" de João de Barros. Escreveu as que vão da IV à XII, mas só publicou completas a IV, V e VII e um resumo da VIII e IX porque a VI ardeu na casa de imprensa, a VIII e a IX foram roubadas, e a XI desapareceu.

Em Janeiro de 1568 João de Barros foi vítima de um avc e exonerado das suas funções na Casa da Índia, recebendo título de fidalguia e uma tença (pensão) régia do rei Dom Sebastião. 

João de Barros morreu, a 20.10.1570, na mais completa miséria, sendo tantas as suas dívidas que os filhos renunciaram ao seu testamento.

Enquanto historiador e linguista, João de Barros merece a fama que começou a correr logo após a sua morte. As suas "Décadas" são não só um precioso manancial de informações sobre a história dos portugueses na Ásia como são o início da historiografia moderna em Portugal e no Mundo. 

Inicialmente o autor propunha-se um projecto muito ambicioso. Seria constituído por três partes: Milícia, relativa às conquistas dos portugueses nos quatro continentes (Europa, África, Ásia, Brasil); Navegação, com a descrição geográfica desses territórios; Comércio, relacionado com a transacção quer de produtos naturais quer artificiais. Assim, “concebeu uma história do mundo centrada na expansão portuguesa, dividida em quatro partes abrangendo os quatro continentes: Europa, Ásia, África e Santa Cruz” (que era então a designação do Brasil). 

“Mas deste grandioso plano apenas ficou a Ásia, dividida, como já se disse, em quatro Décadas” (in cit. Infopédia). Mas, dessa obra enciclopédica, “em vida, só apareceram as três primeiras Décadas da Ásia (1552, 1553, 1563)” (id). A última década ficou incompleta e só foi publicada em 1615. Além disso, sublinhe-se que se trata de um dos primeiros relatos da acção colonizadora europeia no mundo.

De sublinhar, por fim, que “a insuficiência do conhecimento dos locais e ambientes da expansão e a dureza da censura cortesã impediram-no de construir uma obra de inteira verdade. Mas as Décadas são a obra mais conhecida de João de Barros e contêm notáveis passos narrativos e descritivos.” (Idem).

Para além das suas obras já referidas, escreveu ainda panegíricos: de D. João III (em 1533); da Infanta D. Maria (em 1555) - tratando-se da Infanta filha de D. Manuel e de sua terceira mulher, D. Leonor, irmã do imperador Carlos V.






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