quinta-feira, maio 24, 2012

MEMÓRIA DO TEMPO QUE PASSA - III



Foi no dia 22.05.1662, fez anteontem 350 anos, casou a infanta D. Catarina de Bragança, filha de D. João IV, com Carlos II, rei de Inglaterra, na sequência do terceiro tratado de aliança entre Portugal e a Inglaterra (1661).
Continuação…



Em finais de Abril, princípios de Maio de 1662, chegou a armada inglesa, que devia conduzir a bordo a nova rainha. O almirante que comandava a armada vinha investido de poderes especiais, como embaixador extraordinário.

D. Catarina partiu acompanhada de vários membros da corte. Mas antes de embarcar todos se dirigiram à Sé, onde se celebrou missa solene e Te­Deum. Houve salvas da artilharia, repiques de sinos, pomposos ornatos nas ruas por onde passava o cortejo, o som das trombetas, charamela e outros instrumentos, tudo contribuía para abrilhantar a festa dos desposórios reais. Finalmente, a nova rainha entrou no bergantim real, adornado com magnificência, e navegou para bordo da nau Grão-Carlos, que capitaneava a armada, acompanhada de duas das suas damas. [Wiki: D. Catarina…]

A data do casamento foi também, durante algum tempo, matéria incerta. Duvidava-se se o régio enlace se tinha verificado a 21 de Maio se no dia imediato. Mas um artigo do Daily News, que o Diário de Notícias transcreveu, veio esclarecer que, por acção e a pedido do nosso (penúltimo) rei D. Carlos (33º), na sua última viagem a Inglaterra, o vigário da igreja de S. Tomás, de Portsmouth, onde ocorreu o enlace e se encontra o seu registo, mandou fotografar o assento par lho enviar. Mas atendendo “à antiguidade do pergaminho a ao desmaiado da escrita” resolveu “fazer duas fotografias, do assentamento original” e “duma excelente copia da certidão, feita em 1880, que foram inseridas “numa pasta de couro vermelho e enviadas para Londres ao rei Dom Carlos”, onde ele então se encontrava. E reza a certidão: «0 nosso augusto Soberano Lorde Carlos II, pela Graça de Deus, rei da Grã-Bretanha, França e Irlanda, Defensor da Fé e a Ilustríssima Princesa D. Catarina, Infanta de Portugal, filha do falecido D. João IV, e irmã de D. Afonso, presente rei de Portugal, foram casados em Portsmouth na quinta feira, vigésimo segundo dia de Maio, do ano do N. Sr. de 1662, 14.º do reinado de SM, pelo R. R. F. in G. Gilbert, Bispo Lorde de Londres, Deão da Real Capela de Sua Majestade na presença de grande parte da nobreza dos domínios de Sua Majestade e da de Portugal.» [Wiki, id]

É assim que o tratado ango-luso de 23 de Junho de 1661, que, além do seu objectivo específico, confirmava os anteriores tratados assinados em 1642 e 1654, foi assinado.
Ou seja: tivemos em 1642, o Tratado (com a Inglaterra) renovando a nossa velha Aliança (e a mais antiga da História ocidental), no reinado de Carlos I, pai de Carlos II; em 1654, novo tratado com a Inglaterra do Protectorado, a Inglaterra da mencionada República Puritana e ditatorial dos Cromwell, Oliver (pai) e Richard (filho) de 1653 a 1659; por fim o referido Tratado Luso-britânico de 23 de Junho de 1661, o Tratado de Whitehall, renovando a Aliança e contratando o casamento do rei inglês Carlos II e a infanta D. Catarina de Bragança. [GEPB]

O Tratado de Whitehall, de 23.06.1661, tinha, entre o respectivo clausulado, um artigo secreto pelo qual “a força que fosse enviada pelo rei britânico para tomar posse de Bombaim deveria, assim, seguir suficientemente apetrechada e mandatada para defender as possessões portuguesas, comprometendo-se o dito monarca a combater pela restituição das conquistas” que tivessem sido feitas pelas Províncias Unidas [ou República das Sete Províncias Unidas dos Países Baixos (1581-1795)] ao longo das negociações para um acordo luso-holandês [Nobre].

A efectivação da entrega de Bombaim foi, de facto, tarefa difícil, tendo o vice-rei português, António de Melo e Castro, feito todo o possível para a evitar, tendo mesmo chegado ao ponto de a recusar [id]. Em vão, evidentemente.

Nada fácil, também, foi o cumprimento do dote, já que Portugal atravessava, então, graves dificuldades financeiras, desde os anos 50 desse séc. XVII. Mas a própria rainha-mãe deu o exemplo, vendendo suas jóias e empenhando pratas e jóias da coroa. De todo o modo, a entrega do valor do dote não pôde ser feita de uma única vez.

O casamento de D. Catarina “com Carlos II acabou por não dar os frutos que a Coroa portuguesa desejava, saldando-se pela perda das possessões cedidas e pela abertura ao comércio das colónias a mercadores ingleses”. [Info]

A figura fundamental deste processo foi, como logo se deixa ver, “o diplomata português D. Francisco de Melo e Torres, o principal responsável pelo sucesso das conversações entre Portugal e Inglaterra, o que muito contribuiu para o feliz culminar do nosso processo da Restauração.” [AM]

A vida de D. Catarina na corte inglesa não foi muito fácil: primeiro, devido às relações amorosas do rei; depois porque a sua fé, vincadamente católica, gerou alguma suspeição por parte dos Anglicanos que tentaram por várias vezes obrigar o rei a divorciar-se, apoiando-se na infecundidade da rainha.
Quanto à sua infertilidade, a verdade, realmente, é que nenhuma das suas várias gravidezes foi por diante.

Carlos continuava a ter filhos de suas amantes.


Como sempre aconteceu em todas as monarquias, todos os reis tiveram filhos naturais, bastardos. Uns mais que outros. Mas a prole, por essa via, era geralmente grande. Assim também aconteceu com Carlos II que teve numerosíssimas amantes, das quais teve, que se saiba, 16 bastardos. Só de Barbara Palmer (1640-1709), a sua favorita, que ele fez condessa e duquesa, ele teve seis filhos.
Por vezes, os filhos naturais vinham a ser reis.


Contudo insistia em que ela fosse tratada com respeito e recusou divorciar-se, apesar das muitas insistências do embaixador de Espanha e do conde de Bristol que desdenhavam da rainha tentando convencer Carlos II que D. Catarina era feia, defeituosa e doente.

Afinal, um registo romanesco descreve-a como pequenina, roliça e com umas “favolas” ligeiramente salientes. Nada de grave nem impeditivo.

Da sua correspondência com amigos deduz-se que tinha razões para estar agradado da mulher, conquanto a achasse pequenina. [Boléo]

Também os meios políticos britânicos insistiam com Carlos II para que se divorciasse, já por a rainha ser estéril já por ser católica. Mas nem aí Carlos cedeu.

A rainha foi mesmo alvo de calúnias graves como a de ser a “mulher-de-mão” do pontífice romano contra a própria vida do rei seu marido.
Mas a intervenção do embaixador extraordinário, o nobre Henrique de Sousa Tavares aclarou a situação e fez com que os caluniadores fossem punidos. Carlos compreendeu então como sua mulher foi alvo de invejas e falsidades, mantendo por ela o respeito que sempre lhe mereceu.

Onde a popularidade da rainha foi grande foi nas colónias americanas. Chegados os ingleses a Nova Iorque em 1640 (até essa altura nas mãos dos holandeses e a chamar-se Nova Amesterdão), logo a um dos cinco “bairros” da cidade foi dado o nome de Queens, em sua homenagem, e à região em que se inscrevia, um dos 16 condados da cidade (condado: divisão administrativa mais ou menos equivalente ao nosso distrito), Queens County, pela mesma razão. [Wiki: Queens]

Um ponto comum em todos os registos respeitantes a D. Catarina de Bragança é ela, segundo uns, ter introduzido o hábito de tomar chá (para os hábitos locais a cerveja era a bebida preferida até então), segundo outros, pelo menos o de ter “instituído” o "five o'clock tea". Mas também lhe são atribuídos a introdução do uso das loiças de mesa de porcelana e dos talheres.

Tendo enviuvado em 16.02.1685 – ao cabo de 23 anos de casamento, ela com 47 e Carlos com 55 anos -, Catarina permaneceu em Inglaterra durante cerca de sete anos, até depois do reinado do cunhado Jaime II, também católico (seu irmão, Carlos, ter-se-á convertido no leito de morte) e igualmente da Casa Stuart, quando ele foi deposto e substituído no trono por sua filha, Maria II e pelo genro, o holandês Guilherme, príncipe de Orange.

D. Catarina embarcou para Portugal em 29.03.1692, e depois de ter passado por diversas cidades europeias entrou em Lisboa em 20.01.1693, no meio de grandes festejos, instalando-se no Palácio da Bemposta, hoje mais conhecido por Paço da Rainha, ali ao Campo de Santana, outrora designado Campo Real, onde hoje está instalada a Academia Militar.

A partir daí teve D. Catarina intervenção em negócios de Estado, como no Tratado de Methuen, ou Tratado dos Panos e Vinhos, entre a Grã-Bretanha - rainha Ana, irmã de Maria II, igualmente filha de seu cunhado Jaime II (sua sobrinha por afinidade) - e Portugal (D. Pedro II), assinado em 27.12.1703, o qual “com três artigos, é o texto mais reduzido da história diplomática europeia” [Wiki: Tratado de Methuen].

Como foi a partir daí que assumiu, por duas vezes, a regência do reino em nome do rei seu irmão D. Pedro II (23º): a primeira em Maio de 1704, quando D. Pedro partiu, à frente do exército, para a guerra da sucessão de Espanha. Depois, e durante algumas semanas, em 1705, por doença grave do rei.

D. Catarina “morreu em Lisboa em 31.12.1705 no palácio do Campo Real ou Bemposta. Enterrada no Real convento de Belém ou Igreja dos Jerónimos, o seu corpo foi depois transladado para o panteão dos Braganças em São Vicente de Fora.” [Wiki: D. Catarina…]






Fontes:
- AM – site da Academia Militar
- Biker - "Collecção de Tratados e concertos de pazes que o Estado da India Portugueza ..." Por Julio Firmino Judice Biker
- Boléo - D. Catarina de Bragança (1638-1705) Infanta de Portugal e rainha de Inglaterra, por Maria Luísa V Paiva Boléo, apud Internet
- BU - Biblioteca/Enciclopédia Universal, Texto Editores
- GEPB, 32, 623
- Info – Infopédia, a Enciclopédia online da Porto Editora
- Nobre - A entrega de Bombaim ao Reino Unido (1661-1668) – Um processo Político-Diplomático, de  Pedro Alexandre David Nobre, Mestrado em História e Arqueologia dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa (séculos XV-XVIII) Julho 2008 – Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, apud Internet
- Saraiva - José Hermano Saraiva - Breve História de Portugal
- Sérgio - António Sérgio, Breve Interpretação da História de Portugal
- Wiki – Wikipédia, a enciclopédia livre (entradas referidas)

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