sábado, novembro 15, 2008

À MARGEM / NO RESCALDO DAS US2008 - I



Hesitei em deixar aqui esta mensagem de 11 do corrente, do “nosso enviado especial” às presidenciais dos States 2008, na sua totalidade, por razões óbvias. (Isto – as tais óbvias razões -, claro, para os que me conheçam)
Mas deixá-la truncada, não correspondia ao desejo e intenção de Fernando A S Marques.
Assim, e embora com atraso, deixo o registo completo.



equipa de voluntários, da campanha de Obama, de que fazia parte
Fernando Almeida Sousa Marques (na foto, o último da nossa direita)



11 de Novembro de 2008 14:11

Caros amigos,
Surpreendentemente recebi uma carta de um amigo de um amigo, que agora amigo é, que dizia coisas como estas:
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Meu caro amigo Fernando S Marques
Não estranhe o tratamento. Mas sendo o Fernando amigo do CSP, que é meu amigo de bem longa data (uns 40 anos, ou por aí próximo), acho que somos amigos, eu e o Fernando, desde, pelo menos, que vocês o são. Pese, embora, não nos conhecermos ainda pessoalmente.
Apreciei, vivamente, as suas crónicas enviadas da Flórida, acerca desta explosiva e sensacional – e única, estou certo – campanha presidencial dos States. Foi um importante guia e um valioso complemento em relação ao que os media nos iam oferecendo.
Foi uma mais valia de que, uns tantos, pudemos beneficiar.
...
Não o quero desarmar, nesta minha abordagem, e devolver-lhe o "suspense" com que costumamos encarar um primeiro "encontro" com alguém, mas sempre lhe direi que achava difícil que um americano, fosse ele de que quadrante geográfico fosse, e tivesse ele a tez que tivesse - mas que nos EU, teria de ser, necessariamente, democrata -, repito, sempre me causou apreensão o receio de uma impossibilidade de qualquer alteração na política agressiva e de autoritário controlo geoestratégico do globo, entre outras maléficas influências e atitudes, por parte de um presidente americano... Achava-o (será que acho, ainda?) – o volte face – extraordinariamente difícil, senão impossível.
A realidade, muito crua, porém, é que Obama foi eleito pelo voto muito explícito e bem expresso dos americanos... Para prosseguir os interesses destes.
Na mais fria análise, matéria iniludível, objectivo inelutável.
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Na verdade, será pedir e expectar excessivamente, mas ainda me resta alguma esperança de que esse cavaleiro deste apocalipse em que nos encontramos, Barack Hussein Obama (não há ter medo dos nomes), possa dar um primeiro passo nessa direcção.
É que, por mais pessimismo que me revolva o íntimo e as entranhas, a verdade é que me parece impossível que o Mundo prossiga eternamente nesta rota de uma política destrutiva e assassina relativamente ao ambiente e à fome, miséria e toda a espécie de carências e marginalizações de que a grande maioria dos tristes e involuntários habitantes deste terráqueo planeta são vítimas.
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Há um interesse, nosso, nesta activa participação?
Mas ele é demasiado evidente para poder ser ignorado.
Sendo certo, contudo, que se trata de um interesse, não pessoal nem mesquinho, mas para bem de toda a Humanidade.
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Pelo interesse das questões e depois de reler a minha resposta, decidi partilhar convosco ambas as prosas...
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Caro amigo JLF,
A vida é feita de muitas coisas, entre elas descobrirmos um amigo numa esquina inesperada.
As mudanças históricas, grandes e pequenas, ajudam a que isso aconteça, seja num encontro de mulheres a lutar pelo direito ao voto (como aqui aconteceu, não há muito tempo, quando os homens brancos já votavam há mais de um século!), seja numa reunião de voluntários organizada num café para inscrever pessoas nos cadernos eleitorais, seja no dia de eleições em que o nosso próprio carro serve para transportar gente que sem ele não votaria, seja no espaço cibernético em que escrevemos uma mensagem mas nunca sabemos por onde ela voará...
Quanto às suas apreensões, são minhas também e de muita gente. Principalmente de pessoas que vivem fora dos EUA e que têm uma visão não alinhada com a dos interesses imperiais.
O complexo político-militar-industrial-financeiro não deixou de existir de um dia para o outro. Os interesses egoístas de uma super potência também não. Tudo isto alimentado por um provincianismo nacionalista e patrioteiro que dificulta ou impede o debate das questões e a reclusão de consciências.
Obama pode ser prisioneiro do seu tempo. Ou poderá dar algum passo mais.
Pode ter cumprido o seu papel. Ou poderá continuar a surpreender os que o menosprezaram.
Pode governar ao centro, em nome da grande América que repetidamente anunciou. Ou poderá não se espartilhar em acordos de conveniência, manobras de bastidores, falsos sorrisos de quem lhe chamou tudo e agora o bajula.
Isso não dependerá apenas dele. O movimento cívico que ajudou a criar terá de continuar a inovar, o que, afirmo-o desde já (até por experiência própria), é muito difícil que aconteça. Mas, para além deste e de outros factores endógenos, outros representarão um papel mais ou menos importante: a comunidade internacional e, principalmente, os mais de 80% que lhe deram o seu apoio e o consideraram o seu Presidente (espero que não adormeçam); a crise sistémica do capitalismo que está longe de ser ultrapassada (e como será?); os problemas concretos que há por resolver (a existência dos Estados da Palestina e Israel é um exemplo).
Thomas Jefferson disse, algures na Virgínia (Estado onde, agora, Obama ganhou e que não era ganho por qualquer candidato democrata há quase 50 anos), que a única utilidade de um negro era ser escravo. Era o que se pensava na altura, o que pensavam todos aqueles que tinham construído fortunas a comercializar escravos e a desenvolver os seus negócios com essa mão-de-obra tão útil e barata. Não é tempo de reescrever a história e de dizer que a Revolução Americana não foi dirigida por patriotas, maçons, democratas inspirados nos princípios e no exemplo da Revolução Francesa. Mas, durante muitos anos, pretos e mulheres não faziam parte dos que actuavam no palco da política. Tinham lugares reservados nos bastidores, donde era bom que não saíssem.
Um amigo meu escreveu-me ontem para sublinhar que os que por aí (e por quase todo o lado, penso eu) falavam da vitória de Obama (jornalistas, comentadores, políticos mais ou menos engravatados) apenas referiam os balões (a cor da sua pele, o sorriso ou a simpatia de Obama, o seu discurso apelativo, a sua mensagem precisa e repetida, a sua mulher educada e inteligente, etc) e desconheciam por completo a capacidade de organização e mobilização de uma equipa que trabalhou na sombra, mas foi a base estrutural da vitória da Esperança sobre o Medo. É o costume. O culto da personalidade é sempre mais fácil que a pesquisa da verdade. A verdadeira notícia, nestes tempos em que o seu tempo de vida é limitado, passageiro e volátil, tem de ser sensacionalista; meter sangue ou lágrimas; divulgar muita violência e mostrar pouca inteligência; tem que ser fácil; tem que responder às necessidades básicas de um público adormecido que não percebe que está apenas no intervalo entre anúncios; tem que ser substituível por outra qualquer notícia igualmente sensacional e falsa porque superficial. Qualquer outra coisa, em vez do lápis azul de outrora, tem uma outra forma de censura ainda mais condenável e largamente divulgada e praticada: a falta de interesse jornalístico! Declarada pelos próprios jornalistas!
Ai a invejazinha... doença infantil do provincianismo português e universal...
Assim estamos, caro amigo. E agora?
Não sei o que se irá passar. Todos sabemos, por experiência própria, que as desilusões só acontecem a quem tem ilusões. Mas também sabemos que houve e haverá figuras que se elevaram e elevarão acima da mediocridade que os rodeava, para marcarem um tempo e um espaço. E ficarem na História. Ficaram na História porque não era isso que os motivava!
Espero que Obama não venha a ser conhecido, apenas, por ter sido o primeiro Presidente de origem afro-americana. Se o for, mais uma vez, houve uma carne para canhão que serviu para ganhar uma batalha, mas foi traída pelo resultado da guerra...
Um abraço,
fernando


Meu caro amigo Fernando S Marques

Não estranhe o tratamento. Mas sendo o Fernando amigo do CSP, que é meu amigo de bem longa data (uns 40 anos, ou por aí próximo), acho que somos amigos, eu e o Fernando, desde, pelo menos, que vocês o são. Pese, embora, não nos conhecermos ainda pessoalmente.

Há entre mim e o C, além de uma grande estima, uma manifesta sintonia política, em termos genéricos, mas que nem um pequeno desajuste nos embaraça ou faz atrapalhar, em nada, um relacionamento de vera e velha amizade, na melhor harmonia, irmanados que estivemos, por exemplo, em lutas pela restauração da democracia e retorno das liberdades (que alguns afirmam e com, pelo menos, aparente razão, estarem de novo em perigo) no nosso país.

Não somos gémeos porque há, entre nós, duas grandes diferenças, tão importantes (!) e essenciais (!) como estas: o Carlos tem ainda menos cabelo que eu (embora eu já tenha pouco), o que significa que sou menos permeável às manifestações de inteligência e cultura que ele.
Por outro lado, e para cúmulo (hélas!), sou muito mais velho que o Carlos (5 meses... Imagine bem a enormérrima diferença) mas, infelizmente, muito menos sensato que ele, e em muito maior medida do que a abissal (!) distância, no tempo, que nos separa.

Apreciei, vivamente, as suas crónicas enviadas da Flórida, acerca desta explosiva e sensacional – e única, estou certo – campanha presidencial dos States. Foi um importante guia e um valioso complemento em relação ao que os media nos iam oferecendo.
Foi uma mais valia de que, uns tantos, pudemos beneficiar.

Apesar do entusiasmo e da dedicação que me mereceu a divulgação das suas crónicas, não posso esconder que me acompanhou sempre, durante esta parte final da campanha, sobretudo, uma certa apreensão...
Não o quero desarmar, nesta minha abordagem, e devolver-lhe o "suspense" com que costumamos encarar um primeiro "encontro" com alguém, mas sempre lhe direi que achava difícil que um americano, fosse ele de que quadrante geográfico fosse, e tivesse ele a tez que tivesse - mas que nos EU, teria de ser, necessariamente, democrata -, repito, sempre me causou apreensão o receio de uma impossibilidade de qualquer alteração na política agressiva e de autoritário controlo geoestratégico do globo, entre outras maléficas influências e atitudes, por parte de um presidente americano... Achava-o (será que acho, ainda?) – o volte face – extraordinariamente difícil, senão impossível.

Certo que a nossa (não americanos, mas democratas) tendência é para ver na (neste momento, e por ora, única) grande potência, melhor, no seu máximo representante, um papel de cidadão do mundo, na colaboração da vigilância, segurança e bem estar do planeta e a convergir nesse sentido com os mais líderes políticos mundiais.

A realidade, muito crua, porém, é que Obama foi eleito pelo voto muito explícito e bem expresso dos americanos... Para prosseguir os interesses destes.
Na mais fria análise, matéria iniludível, objectivo inelutável.

Na verdade, será pedir e expectar excessivamente, mas ainda me resta alguma esperança de que esse cavaleiro deste apocalipse em que nos encontramos, Barack Hussein Obama (não há ter medo dos nomes), possa dar um primeiro passo nessa direcção.
É que, por mais pessimismo que me revolva o íntimo e as entranhas, a verdade é que me parece impossível que o Mundo prossiga eternamente nesta rota de uma política destrutiva e assassina relativamente ao ambiente e à fome, miséria e toda a espécie de carências e marginalizações de que a grande maioria dos tristes e involuntários habitantes deste terráqueo planeta são vítimas.
Não se terão, já, apercebido os poderosos e ricos que tudo se encaminha, nomeadamente, para a sua própria ruína e eliminação?
A longo prazo, pensam eles? Mas, a este ritmo, quem o poderá, assim, perspectivar?

Bom, Caro Fernando, não tenho o direito de lhe roubar tanto do seu precioso tempo.
Tanto mais que terá bem melhores e interessantes, criativas e empreendedoras pessoas a quem dedicar a sua atenção do que a este modesto e apagado escrevinhador.

Mas deixe que lhe preste, desta vez em privado (porque no éter já o fiz), a minha homenagem pelo seus valiosos trabalho e empenho, que nos foi dado usufruir, fazendo-o por mim e pelos raros leitores a quem me foi dado divulgar as suas "Obama news", num despretensioso e ignorado contributo para a grande vitória do novel presidente americano.

Há um interesse, nosso, nesta activa participação?
Mas ele é demasiado evidente para poder ser ignorado.
Sendo certo, contudo, que se trata de um interesse, não pessoal nem mesquinho, mas para bem de toda a Humanidade.

O meu (estou seguro de que o nosso) muito obrigado, solidário apoio e apertado abraço
Jlf

PS: porque tanto falo dele, vou enviar cópia deste mail ao nosso C

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