«Horror mediatizado
Nuno Pacheco / EDITORIAL / PÚBLICO / TR 07JUN05
O vídeo exibido em Haia para provar os horrores de Srebrenica confirma uma velha tendência de carrascos e torturadores para mediatizar os seus actos
As imagens passaram com insistência nas televisões internacionais, há alguns dias. Não mostravam sangue nem gente degolada, mas chocavam sobretudo pela quase indiferença de carrascos e condenados, unidos por iguais desumanidades: os primeiros, rosto trocista e eficácia assassina, brincavam com as suas vítimas como o gato brinca com o rato, antes de lhe desfechar o golpe fatal; os segundos, feitos farrapos humanos por sevícias que se adivinhavam nos seus rostos inexpressivos e vazios de vida, conformavam-se ao estranho ritual. Deitaram-nos no chão para os abater, aos seis. Mas pensaram melhor: iriam abatê-los noutro sítio. Obrigaram-nos a pôr-se de pé e a caminhar, trôpegos. Depois, um a um, liquidaram os primeiros quatro. Para prolongar o sofrimento dos restantes, obrigaram-nos a carregar os corpos dos companheiros mortos até a uma vala. Onde por fim os abateram também. Sem gritos, nem revolta, nem um último sopro de dignidade. Isto passou-se em 1995 em Srebrenica, na Bósnia, e o vídeo foi exibido no Tribunal de Haia, onde Milosevic continua, trocista e impassível, a desdenhar de um mundo que se choca com tais horrores.(...)»
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